Paradigmas dos processos de criação em mídias digitais: uma cartografia

Lucia Leão

Lucia Leão é Bacharel em Artes Plásticas, Mestre e Ph.D. em Comunicação e Semiótica e Pós Doutorado em Artes. Professora Doutora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). (Brasil)


Como citar esse texto: Como citar este texto: LEÃO, L. Paradigmas dos processos de criação em mídias digitais: uma cartografia. V!RUS, São Carlos, n. 6, dezembro 2011. Disponível em: <http://143.107.236.240/virus/virus06/?sec=3&item=1&lang=pt>. Acesso em: 23 Nov. 2024.


Resumo

Quais são os elementos fundantes (pressupostos teóricos e conceitos) e as características do pensamento inventivo realizado em mídias digitais? Esse artigo explora os processos de criação em rede. Mais especificamente, investiga como as mudanças recentes nas mídias digitais têm incidido sobre os procedimentos e métodos de criação e possibilitado a emergência de projetos criativos em rede e em permanente fluxo de transformação. O objetivo norteador do presente artigo é compreender as características dos processos criativos em rede assim como os movimentos do pensamento que compõem os itinerários de produção. O artigo se estrutura em três fases. Inicialmente apresenta o contexto e os pressupostos que fundamentam a pesquisa. Em seguida, propõe uma reflexão a respeito dos modelos paradigmáticos que definem processos criativos tanto em termo de seus objetivos, como a natureza e a perspectiva de seus questionamentos. A terceira parte se dedica a explorar os processos criativos mediados por tecnologias digitais.

Palavras-chave: processos de criação nas mídias digitais, teoria e crítica do processo, poéticas artísticas, design.


Considerações iniciais

Esse artigo propõe uma possível cartografia dos paradigmas dos processos de criação em mídias digitais e dialoga com uma pesquisa mais extensa desenvolvida como Professora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP, na linha de pesquisa em Processos de criação. Atuamos nessa linha juntamente com Cecília Almeida Salles e nossas atividades científicas de pesquisa propõem investigações que articulam conhecimentos advindos de teorias e práticas. As pesquisas caminham por três vertentes: processos de criação crítica em diferentes expressividades midiáticas; acompanhamento crítico de processos criativos e, trabalhos de curadoria que partam de propostas conceituais envolvidas com o processo de criação (LEÃO; SALLES, 2011). As investigações das etapas que compõem a construção de um produto midiático enfatizam as escolhas conceituais e teóricas. Entre os objetos de pesquisa de linha, pode-se citar: processos de criação em mídias diversas; produção do conhecimento na área de Comunicação; diálogos com o conceito de experiência estética e reflexões sobre conceitos de autoria[1]. Entre nossa recente produção, destacamos “Arquivos de criação: arte e curadoria” (SALLES, 2010) e “Processos de criação em mídias digitais: passagens do imaginário na estética da transcriação” (LEÃO, 2010a).

Laan Mendes de Barros, afirma a possibilidade de um deslocamento do antagonismo entre teoria e prática rumo a uma “práxis da comunicação”. Em sua argumentação, com objetivo de superar a dicotomia, Barros retoma o sentido de práxis:

Quando saber e fazer se articulam, quando a prática incorpora a reflexão crítica do que se está fazendo, o que se tem é o exercício da práxis. O termo práxis, no grego, não indica a mera dimensão pragmática da produção, própria do termo poiesis, mais ligado ao fazer técnico; extrapola a noção de prática, presente no termo praktiké. Práxis, termo também presente no latim, implica em um processo de pensamento-ação, de ação consciente, que incorpora valores e implica em inserção no espaço social e tempo histórico. Pensar em práxis implica, portanto, em um fazer conseqüente, com sentido, significado (BARROS, 2011, p. 9).

Como veremos, a pesquisa em processos de criação pressupõe uma perspectiva híbrida, na confluência entre experimentações poéticas e reflexões conceituais. Poderíamos dizer: é uma pesquisa rumo à práxis.

Pressupostos da pesquisa

Apresentaremos um breve resumo das matrizes conceituais que embasam nossas investigações, com objetivo de esclarecer os pontos de partida da pesquisa em processo de criação. Conforme veremos, as explicitações dos pressupostos epistemológicos manifestam-se não só em teorias, mas, principalmente, nas práticas que compreendem os processos de criação. Organizamos a seguir três proposições lógicas sobre as quais nosso raciocínio se apóia. Essas proposições recebem a denominação “princípios” à medida que organizam e sistematizam os modos através dos quais nossas pesquisas se realizam.

O primeiro princípio propõe que os processos criativos sejam considerados como sistemas comunicacionais interativos abertos que incluem elementos de diversas naturezas. Contexto sócio-cultural, mídias, valores, indivíduos, grupos, narrativas, memórias, diálogos, encontros, lugares e temporalidade são alguns dos elementos possíveis de estarem presentes nos processos. Cabe destacar que esses elementos têm características dinâmicas e articulam relações e potências. Adotando-se uma perspectiva sistêmica, o estudo dos processos criativos pressupõe que o sistema não é a simples soma de seus elementos. Isso significa que as características dos elementos considerados de forma isolada são diferentes das características do sistema como um todo. Outra conseqüência dessa abordagem é que as partes do sistema estabelecem um jogo complexo de implicações mútuas, no qual ações e reações se retroalimentam. Essa característica é nomeada causalidade circular. E, finalmente, a perspectiva sistêmica requer um preceito de regulação, pois os elementos devem compartilhar um número mínimo de regras ou convenções.

O segundo princípio anuncia que os processos criativos são redes em permanente transformação. Isso implica renunciar a conceitos como origem e/ou conclusão de uma obra. A topologia das redes requer que conceitos como hierarquias e métodos de organização linear sejam abandonados. Compreendidos a partir desse olhar, os processos criativos se constituem enquanto conjuntos de momentos com potencial gerativo, percursos com versões do desenvolvimento de um pensamento criador.

O terceiro princípio sustenta que os processos criativos, devido as suas características anteriores, sistema comunicacional aberto (1) e rede em permanente transformação (2) demandam um tipo de pesquisa também em rede e com características sistêmicas. Ou seja, a reflexão a respeito dos processos de criação deve ter uma natureza polifônica na qual um conjunto de instrumentais teóricos advindos de diferentes disciplinas comunguem de um discurso orquestrado. Nesse sentido, o corpo conceitual da pesquisa tem, necessariamente, características inter e/ou transdisciplinares.

Considerando-se esses três princípios, propomos a seguir, uma reflexão a respeito de possíveis modelos de produção. A proposta que apresentamos se utiliza de um procedimento de modelagem cognitiva e tem como fundamento três matrizes da teoria crítica da comunicação.

Modelos de produção

Considerando-se a natureza comunicacional e a perspectiva de seus questionamentos, quais são os modelos matriciais que organizam os processos de criação? Propomos que os processos de criação nas mídias sejam estudados a partir de três possíveis modelos conceituais que se conectam e revisitam algumas das teorias da comunicação. São eles: o modelo informacional, o modelo midiático e o modelo pós-midiático. Eles serão apresentados em três camadas: características da corrente teórica; características do modelo e suas aplicações nos processos de criação em geral; e uma reflexão a respeito da presença desses modelos nos processos de criação em mídias digitais.

Modelo informacional

O primeiro modelo que iremos apresentar parte da visão informacional clássica, baseado na tríade emissor-meio-receptor (E-M-R). Tem como meta a transmissão de conteúdos da forma mais precisa possível. O paradigma informacional linear, como também é conhecido, se estabelece com os estudos dos meios de comunicação de massa e define os meios como neutros, isto é, meros instrumentos de transmissão de informação[2]. Assim, nesse modelo, o meio deve ser transparente, de forma a evitar ruídos no processo comunicacional.

É interessante observar que esse modelo deriva da teoria matemática da comunicação (Shannon e Weaver) que, paradoxalmente, não se interessa pelo nível semântico da comunicação. O modelo de Shannon e Weaver pensa a informação em um sentido totalmente diferente do pensado pelas ciências da comunicação, uma vez que utilizam do conceito de informação como algo objetivo, passível de ser codificado em sinais (pelo emissor) e decodificado em sinais (pelo receptor). Para essa teoria, a informação seria algo concreto e exato. A teoria matemática da comunicação foi desenvolvida para ser aplicada por engenheiros no processo de criação de aparatos de telecomunicações. A medida que seu foco era projetar sistemas nos quais a informação pudesse ser transmitida de forma eficiente, essa teoria não se interessava pelo significado da informação. Outros pontos que distanciam essa teoria dos estudos da comunicação incluem: a exclusão dos contextos na análise do processo comunicacional; a redução de aspectos qualitativos do processo, como ruídos e capacidade interpretativa; e o desinteresse pelas características dos meios, que são vistos como neutros e assumem metáforas como “canal”. A respeito das complexas implicações da adoção da “teoria matemática da comunicação” nos estudos comunicacionais ver o excelente texto de Klaus Krippendorff (2009).

Mas, voltando ao modelo informacional, na maneira como é compreendido pelo campo da comunicação, observa-se uma tendência hermenêutica, uma centralização de estudos no âmbito das interpretações e da busca de sentido. Nas palavras de Felinto (2011, p. 6-7):

Como disciplina fundamentalmente preocupada com a investigação de processos de significação entre emissores e receptores, a comunicação se caracterizou como uma investigação de ordem hermenêutica... De análise de conteúdo aos estudos de recepção, trata-se essencialmente de interpretar sentidos... Desse modo, não espanta que os modelos tradicionais da teoria da comunicação tenham quase sempre considerado o ruído como elemento negativo a ser eliminado dos processos comunicativos [...] A concepção comunicacional clássica engendrou uma espécie de “metafísica da comunicação” que nos tornou, talvez, confiantes demais em sua eficácia e transparência.

Processos de criação midiática pautados por esse paradigma partem do pressuposto de que o foco da criação deve ser a mensagem. O(s) autor(es) deve(m) impor ao suporte material sua marca, imprimir seu domínio. Nesse sentido, o(s) agente(s) criadores são dotados de habilidade técnica e domínio material das especificidades dos meios. Nesse paradigma estão todas as maneiras de operar mecanicamente sobre a matéria, como por exemplo, nos processos de esculpir, talhar, modelar, pintar, etc. (LAURENTIZ, 1991, p. 103). Podemos situar aqui também toda investigação crítica que organiza os processos criativos a partir de habilidades e procedimentos de domínio de suportes materiais.

As aplicações do modelo informacional no processo de criação em mídias digitais são amplas e abarcam projetos que exigem um funcionamento controlado do sistema. Quando se projeta uma interface para e-commerce, por exemplo, espera-se que o sistema informacional funcione exatamente como o desejado, evitando-se qualquer possibilidade de ruído ou vírus. O mesmo ocorre em projetos de internet banking e serviços. Também podemos observar a predominância desse modelo na maioria dos projetos de design de videogames. Ou seja, no processo de criação, o designer planeja que determinadas ações do usuário correspondam a reações específicas do sistema. Tais expectativas devem ter suas probabilidades de ocorrência maximizadas e, portanto, nesse sentido, a lógica que prevalece nesse tipo de projeto é a mesma lógica linear do modelo informacional.

Modelo midiático

O segundo modelo inverte o foco de atenção do primeiro e passa a se interessar menos pelos significados da comunicação (nível semântico) e mais pelas características dos meios. Nessa corrente de estudo, Kittler (1999) propõe que se pense a mídia a partir de uma perspectiva “materialista”, sistêmica e histórica. Segundo Wellbery (1999, p. xii-xiii), em seu prefácio, Kittler estabelece um possível programa de pesquisa para uma crítica pós-hermenêutica. Nesse programa, as mídias são aparatos de inscrição, sistemas de notações e redes de discursos.

[1] A respeito dessas pesquisas, ver: Salles (2003, 2010) e Leão e Salles (2011).

[2] Ver, a respeito desse modelo, o artigo de Albuquerque (2002) que discute como a consolidação do campo da comunicação se deu através “do desafio de investigar um conjunto bastante particular de tecnologias da comunicação – as tecnologias de radio e teledifusão (broadcasting)”. Nesse sentido, a implantação desse modelo, fundamental para a estruturação das pesquisas, se atrela a um momento específico e a tecnologias da comunicação também específicas. Nesse artigo, Albuquerque (2002) discute como as mídias digitais desestabilizam o modelo tradicional da pesquisa em comunicação.

O modelo midiático afirma e enfatiza a materialidade dos meios. Aqui o meio não é transparente, ao contrário, é visto enquanto entidade ativamente inscrita no sistema comunicacional e, por suas qualidades, imprime significados à obra e ao processo criativo. Na leitura de Laurentiz (1991, p. 102):

O conceito de materialidade não se opõe ao de matéria; vai além. A matéria é a preocupação mecânica com o suporte material, ao passo que a materialidade abrange o potencial expressivo e a carga informacional destes suportes, englobando também a extramaterialidade dos meios de informação.

Ainda segundo Laurentiz, os atos operatórios da materialidade são atos que ocorrem em um contexto de co-operação no qual as qualidades expressivas dos meios se acoplam à força expressiva do(s) autor(es).

As aplicações do modelo midiático no processo de criação em mídias digitais podem ser observadas em vários projetos. A rigor, todos os trabalhos que exploram as potencialidades dos meios estão incluídos nessa categorização. Aqui é importante pensar as mídias digitais em suas características materiais específicas. Em uma listagem não exaustiva de exemplos, teríamos: a) trabalhos que operam com a programação propriamente dita de softwares, esquadrinhando linguagens e códigos e revelando potenciais generativos da escrita numérica– software arte; b) trabalhos que articulam informações de localização geográfica com sistemas de dados em redes – locativemedia arte; c) trabalhos que especulam com informações do campo da biologia e se utilizam das mídias digitais em processos de simulação da vida – bioarte; d) trabalhos que se apropriam do potencial numérico das mídias digitais com objetivo de gerar visualizações dinâmicas de dados – infodesign; e) trabalhos que descortinam sistemas de automação e sistemas inteligentes, propondo objetos do mundo físico dotados de sistemas de processamento digital, híbridos – robótica, objetos interativos, objetos sencientes; f) trabalhos que criam ambientes imersivos lúdicos e propiciam interações no universo midiático dos games; g) trabalhos que se utilizam do potencial comunicativo das redes digitais em busca de processos telemáticos e/ou telepresença e criam ambientes dialógicos e/ou colaborativos. Enfim, nossa lista poderia continuar por vários territórios da criação em mídias digitais e incluir vários subitens de experimentações poéticas. Mas, para os fins do presente artigo, essa sistematização sumária é suficiente como ilustração dos múltiplos universos que permeiam o campo. O foco do artigo se localiza na última categoria listada.

Modelo pós-midiático

Voltemos agora para a descrição de um possível terceiro modelo que engendra processos criativos. Nesse modelo, que denominamos pós-midiático, os projetos excedem as características de uma determinada mídia e avançam por territórios de natureza plural. O modelo pós-midiático se instaura a partir da observação de obras que não se fixam em determinadas mídias, mas operam em processos de hibridização.

O termo pós-midiático reintroduz uma discussão bastante rica levantada por Krauss em seu livro “A Voyage on the North Sea” (1999). Para Krauss, na arte contemporânea, os artistas trafegam por diferentes suportes e processos e buscam abarcar uma heterogeneidade midiática expressiva. Assim, diferentemente de outros períodos da arte, na qual os artistas centralizavam suas produções em uma mídia específica e eram reconhecidos por essa especialização, os artistas pós-midiáticos não se fixam. O estudo de Krauss causou uma série de questionamentos em vários âmbitos. Uma das perguntas que sua proposição incita diz respeito a própria definição de mídia adotada por Krauss. A rigor, as produções de um artista como Marcel Broodthaers (que Krauss apresenta como um exemplo de artista da condição pós-midiática) são representativas de uma heterogeneidade midiática. Mas, por outro lado, a proposição de Krauss foi bastante frutífera ao despertar para os embates e discussões sobre as especificidades dos meios. Com a televisão, o cinema em seus formatos expandidos, o vídeo e as mídias digitais, pensar em pureza de linguagem é, no mínimo, complicado.

O que estamos denominando “processo de criação pós-midiático” evoca também o conceito de remediação proposto por Bolter e Grusin (2000). No livro “Remediation: Understanding New Media”, propõem que os meios digitais recontextualizam e aproximam antigas mídias como fotografia, música, televisão, texto, etc. No entanto, para Bolter e Grusin, esse processo tem uma lógica dupla pois, ao mesmo tempo que é uma ação de multiplicação de mídias, a remediação é também um movimento de apagamento das mídias. Esse apagamento pode ser observado na dissolução da consciência do próprio papel das mídias como elementos instauradores de visões de mundo. Nesse sentido, Bolter e Grusin, ao problematizam a experiência de imersão em ambientes digitais, retomam a ideia de narcótico de McLuhan.

Nossa proposta de modelo para processos de criação pós-midiáticos se fundamenta em práticas constantes nos meios digitais, mas, também, se abre em direção de projetos que operam nas passagens entre as mídias (BELLOUR, 1993, 1997). O que é importante enfatizar nesse modelo é que os processos que emergem a partir dessa perspectiva trabalham na intersecção de visão midiática e visão informacional. Nessa abordagem, os processos se interessam tanto pelas características específicas das mídias (e isso se reflete nas escolhas conceitualmente embasadas das mídias que irão participar do projeto), quanto nos conteúdos das mensagens que se propõem a discutir. Em geral, os conteúdos e os discursos (nível semântico) organizam as proposições em múltiplas mídias. Enfim, são processos que operam com metas duplas, entrelaçadas. Podemos observar esse tipo de procedimento em vários projetos. São particularmente presentes quando se inscrevem em circuitos diversos e assumem um caráter de fluxo. Como exemplo, podemos citar o projeto Guaraná Power, do coletivo Superflex. O projeto, que tinha objetivos políticos e “inseriu fissuras na situação monolítica” do oligopólio da distribuição de bebidas, agregou ações diretamente com uma comunidade de agricultores da Amazônia e procedimentos de inscrição em diferentes mídias (redes sociais, vídeo, internet, camisetas, etc). Não iremos nos aprofundar na análise desse interessante projeto, visto que já o discutimos em mais detalhes em outro momento (LEÃO, 2010b).

Para discutirmos a presença do modelo pós-midiático em relação às práticas com mídias digitais é preciso, antes de qualquer coisa, considerar a natureza dinâmica desse modelo. Assim, são exemplos de procedimentos pós-midiáticos projetos que, embora se utilizem das mídias digitais, não se fixam em mídias específicas. São projetos que se articulam nos trânsitos midiáticos, perpassando diferentes processos de midiatização. Vejamos alguns exemplos.

“Vista On Vista Off # 2”, instalação em rede da artista Denise Agassi nos convida a um exercício de mirar expandido pelas redes de comunicação e bancos de dados online. Composto por um dispositivo central que remete a ideia de mirante, o projeto nos oferece um olhar que caminha por uma visualização planisférica da Terra e, assim, através da representação de toda a superfície terrestre em plano retangular, o sistema nos conduz a pontos geográficos. No processo de criação, a artista optou por um sistema no qual os pontos correspondem a “links”que apontam para vídeos alocados no YouTube. Nesse sentido, o projeto se constitui ao acionar bancos de dados online. Interagir com o sistema nos leva a escolher localizações geográficas. Semelhante a uma bússola, o ato de girar o dispositivo corresponde ao ato de apontar para uma determinada coordenada. Assim, os pontos cardeais, norte, sul, leste e oeste, ressurgem como “senhas” que acionam o processo de desvelar vídeos.

“Catavento”, projeto de Gilbertto Prado, Silvia Laurentiz e Grupo Poéticas Digitais[3] da ECA-USP, é uma instalação interativa que transita por diversos meios e projeta imagens generativas digitais em espaços públicos. O projeto trabalha com uma estação meteorológica digital que capta as informações atmosféricas referentes à umidade, temperatura, velocidade e direção do vento. Esses dados alimentam um processo de decodificação que produz imagens de nuvens que são projetadas em um espaço público. Os dados do vento afetam diretamente a composição visual do projeto. As imagens de nuvens são geradas por sistemas de partículas, normalmente utilizados para simular fenômenos naturais como fogo, água, nuvem, etc. Um algoritmo foi desenvolvido para apresentar visualmente "flocos de nuvens" dentro da palavra “céu”. De acordo com a variação do vento (mais ou menos vento) a palavra "céu" se desvanece com maior ou menor intensidade até desaparecer por completo e tornar a surgir momentos depois. A direção do vento também surge traduzida à medida que a palavra "céu" se desloca em direção à direita, esquerda, cima, baixo, etc.

Processos de criação coletivos em mídias digitais

Vejamos agora uma possível organização matricial com objetivo de compreender as lógicas que operam em processos de criação digital. Nosso olhar se dirige especificamente para processos de criação que se realizam nas redes digitais. Conforme a cartografia de processos de criação que apresentamos no presente artigo, esses projetos se localizam no modelo midiático (isto é, exploram as materialidades das mídias) e se situam como experimentações do tipo “h”, à medida que utilizam o potencial comunicativo das redes digitais com objetivo de criar ambientes dialógicos e/ou colaborativos.

Os processos de criação coletiva em redes digitais se organizam em três categorias que definimos de acordo com as lógicas procedimentais que viabilizam. Como se tratam de processos de criação não podem ser considerados “obras acabadas”. Ao contrário, os projetos que escolhemos para análise se caracterizam justamente por sua natureza de abertura e estarem em constantes transformações.

Processos Associativos

Nessa categoria estão projetos que permitem e estimulam processos de livre movimentação do pensar. Herdeiros de práticas comuns em processos de criação coletivas como os “brainstormings”, os projetos encontrados nessa categorização se interessam por criar espaços que recebem os fluxos de contribuições e acolhem produções variadas. A ênfase desses projetos, ou melhor dizendo, seu interesse primordial, são as conexões, o estabelecimento de redes e a criação de espaço para dialogia. Nesse sentido, propiciam aproximações entre pessoas e campos diferentes. Em suma, são processos de compartilhamento de dados mediados por regras e sistematizações estabelecidos pela comunidade. Situam-se nessa categoria plataformas como Delicious, Twitter, Flickr e YouTube que permitem compartilhamento de endereços de sites favoritos, mensagens, fotografias e vídeos, respectivamente.

Embora esses sistemas se fundem no livre compartilhamento de dados, é importante mencionar que todos eles possuem uma regulamentação mínima que organiza suas práticas. No caso do YouTube, por exemplo, consta na documentação dos termos de serviço (diretrizes da comunidade) normas a respeito do tipo de conteúdo que pode ser publicado. Essa normatização prevê que o detentor da conta é responsável pelos conteúdos que forem publicados em seu nome e se compromete não dispor materiais com direitas autorias. O YouTube compreende que todo material publicado é de autoria do titular da conta e que esse estará cedendo seus direitos à plataforma. Além disso, uma série de instruções estabelece limites ao vetarem produtos midiáticos de natureza preconceituosa, sexo e nudez, apologia ao ódio, atos ilegais, etc.[4]

Processos de Projeto

Denominamos “processos de projeto” plataformas presentes na WWW que, além das características apontadas na categoria anterior (isto é, compartilhamento de dados), estabelecem metas de ações coletivas. Além disso, observa-se nesses casos, a estruturação de etapas e fases, bem como a determinação de materiais, meios e métodos. Wikipedia e Overmundo são alguns exemplos de processos que operam com lógicas dessa natureza. Quer seja com objetivo de organização a informação em uma enciclopédia de livre acesso; ou um site colaborativo voltado para a cultura brasileira e a cultura produzida por brasileiros em todo o mundo, esse tipo de projeto se caracteriza por estar sempre em processo de discussão entre os membros da comunidade. Da mesma maneira, suas normas e procedimentos estão sempre sendo revistos.

O movimento “open source” também se insere nessa categoria à medida que se utiliza das redes de comunicação em seus processos de desenvolvimento criativos. O caso específico do movimento “open source” envolve uma ampla gama de projetos (incluindo softwares, mas não apenas isso) e compreende uma sistematização dos procedimentos de criação coletiva e formas de compartilhamento (DELANDA, 2001).

Processos de Tradução

São freqüentes nas redes digitais projetos que caminham no sentido de agregar procedimentos e conteúdos de diferentes plataformas. Nesse sentido, operam como mediadores por entre diferentes nós da rede. Alguns deles, da mesma forma que intérpretes de linguagens, propiciam espaços de conversações e contribuições múltiplas. Fundados naquilo que Manovich (2001) denominou “estética do banco de dados”, os processos de tradução se apropriam e reconfiguram aplicativos, produções e arquivos das redes para compor suas proposições. Os exemplos dessa categoria trabalham com lógicas de recodificações, apropriações, releitura e remix. Também se inscrevem nessa tipologia os mash-ups, projetos compostos por uma aglutinação de elementos como conteúdo de diferentes fontes com o objetivo de criar uma aplicação diversa. A princípio, os mash-ups são websites que utilizam dados obtidos a partir de provedores de conteúdo (ou de APIs ). É possível encontrar mashups realizados com APIs de diferentes aplicativos: Google Maps, Flickr, YouTube, Twiter, etc. Uma pesquisa sobre projetos dessa natureza revela uma enorme quantidade de aplicativos (ver, por exemplo, “ProgrammableWeb.com”). Vejamos alguns exemplos.

TagGalaxy é um mashup que opera com dados provenientes do Flickr. É possível acessar imagens através da escolha de uma tag. Como se sabe, as tags são sistemas de indexação de dados que podem ser customizados pelo usuário. Presentes no universo Web 2.0, as tags revolucionaram a maneira de organizar e acessar informação digital, à medida que não utilizam uma estrutura hierárquica fixa. No caso do TagGalaxy, o processo de interagir com o sistema nos oferece uma oportunidade de articular os dados na geração de visualizações dinâmicas tridimensionais circulares que remetem a imagens de constelações e sistemas planetários. O tamanho da esfera corresponde à quantidade de imagens localizadas no banco de dados do Flickr. A cada tag buscada uma galáxia de tags relacionadas desvela as redes associativas entre imagens. Ao se clicar sobre a esfera buscada, uma animação apresenta as imagens do banco de dados. Esse projeto aponta características que julgamos definir um processo de criação coletiva em rede. A primeira diz respeito ao fato de que o TagGalaxy não existe enquanto obra acabada mas sim, enquanto processo de visualização dinâmica de dados. Nesse sentido, opera com lógicas combinatórias e, em suas potencialidades, se atualiza a cada escolha que é feita. A interação do usuário pode ocorrer em um nível mais profundo à medida que é possível alimentar o banco de dados do Flickr.

A utilização um mapa interativo com pontos referentes a dados de localização geográfica (latitude e longitude) e um banco de imagens provenientes de um acervo histórico são os pontos de partida de um projeto “Old S.F.”. Mashup que opera com o API do Google Geocoding, o “Old S.F.” é um website que nos oferece um mapa interativo de São Francisco, Califórnia que pode ser acionado em diferentes momentos históricos. A navegação se realiza através de uma linha do tempo que compreende o período 1850-2000. A cada data desse período aparecem pontos no mapa com a indicação do número de fotos disponíveis. O projeto abrange a visualização de 16.000 fotografias provenientes da Coleção de Fotografias Históricas da Biblioteca Pública de São Francisco. O interessante nesse projeto é que é possível viajar pelas imagens do passado da cidade, em diferentes tempos, como se estivéssemos desvelando camadas de um palimpsesto. O projeto convida à colaboração e disponibiliza os arquivos com as descrições das imagens e os geocodes dos pontos do mapa.

[3] Andrei Thomaz, Claudio Bueno, Daniel Ferreira, José Dario.

[4] Ver detalhes dos termos em: http://www.youtube.com/t/community_guidelines?gl=BR&hl=pt.

As poéticas que trabalham com bancos de dados exploram o potencial criativo que habita o cerne das linguagens digitais. Os processos, ao lidarem com sistemas não-lineares complexos, operam questões cruciais da arte combinatória. Quais são os limites de controle do processo? Como a programação do sistema interfere na atualização dos dados? Como o sistema de “tags” filtra e escolhe as imagens que serão veladas e desveladas? Essas e outras questões emergem em processos dessa natureza. Mais ainda, nos fazem refletir aspectos da condição contemporânea da cultura e as possibilidades infinitas de organização e reprogramação de dados. Como tão claramente nos fala Manuel Delanda (2000, p. 273):

[...] nosso mundo é governado não apenas pela dinâmica não-linear, o que torna a previsão de execução e controle impossível, mas também por análise combinatória não-linear, o que implica que os números de misturas possíveis de redes e hierarquias, de comando e de mercado, de centralização e descentralização, são imensos e que nós simplesmente não podemos prever o que serão as propriedades emergentes dessas combinações inumeráveis.

“Your life, our movie” projeto de Fernando Velázquez, Bruno Favaretto e Francisco Lapetina é um projeto que trafega pela estética do banco de dados e opera traduções e remixagens com arquivos de imagens digitais. Proposto em diferentes plataformas, um site e uma instalação multimídia interativa, o projeto foi pensado como processo generativo que se utiliza do banco de dados do Flickr. Nesse processo, uma narrativa audiovisual com imagens da Internet é gerada em tempo real. Os visitantes do espaço expositivo participam digitando palavras no sistema. No caso da interação acontecer através da internet, o processo é o mesmo e consiste na escolha da palavra. Uma programação busca por arquivos do Flickr que receberam esse taggeamento. Três imagens selecionadas são remixadas com arquivos de áudio. As palavras-chaves digitadas são também elementos que compõem o vídeo gerado, estabelecendo relações inesperadas. Após algum tempo sem interação, o sistema começa a funcionar automaticamente trazendo outras palavras e seus arquivos correspondentes. Nessa dinâmica, o aparente “acaso” associativo, gerado pela lógica algorítmica, aspectos das poéticas surrealistas da escrita automática e da poesia potencial são revisitados.

Considerações finais

Nesse artigo, procuramos desenhar uma possível cartografia dos processos de criação coletivos que se realizam em redes digitais. Para isso, partimos da definição de princípios norteadores da pesquisa que realizamos em processos de criação. Inseridos em um ambiente de pesquisa acadêmica que tradicionalmente se interessa por análises de produtos finalizados, ou abordagens de cunho epistemológico, é fundamental que apontemos os princípios de uma pesquisa de natureza teórico-prática. Como vimos, as pesquisas em processos de criação se direcionam rumo a uma práxis, ou seja, uma prática movida por um pensar consciente de suas escolhas e modelos. Nesse sentido, com objetivo de contribuir para a constituição dessa práxis, nos debruçamos para refletir a respeito dos modelos conceituais que embasam os processos de criação nas mídias. Em nossa analise, pudemos constatar a presença de modelos advindos das teorias da comunicação. Esses modelos funcionam como lentes significativas que estruturam visões de mundo e acionam diferentes processos de criação. Definimos três modelos (informacional, midiático e pós-midiático), apontamos suas características, suas aplicações nos processos de criação em mídias diversas e especificamente em processos realizados em mídias digitais. A partir da definição desses modelos, situamos os processos de criação coletivos em mídias digitais e propusemos uma reflexão a respeito de suas características. Pensados enquanto sistemas, redes abertas em constante transformação, essas processos revelam suas especificidades. Esperamos que a tipologia de processos que propusemos nesse artigo possa contribuir para a reflexão a respeito dos métodos e procedimentos que permeiam as experimentações com mídias digitais.

Referências

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Paradigms of creation processes in digital media: a cartography

Lucia Leão

Lucia Leão is Bachelor of Arts, Master and Ph.D. in Communication and Semiotics and Post Doctorate in Arts. Professor of Program Post-Graduate Studies in Communication and Semiotics at the Catholic University of São Paulo (PUC-SP).


How to quote this text: How to quote this text: Leão, L., 2011. Paradigms of creation processes in digital media: a cartography, V!RUS, [online] n. 6. Translated from Portuguese by Paulo Ortega. [online] Available at: <http://143.107.236.240/virus/virus06/?sec=3&item=1&lang=en>. [Accessed: 23 November 2024].


Abstract

What are the foundational elements (theoretical principles and concepts) and characteristics of the inventive thinking realized in digital media? This article explores creation processes in networks. More specifically, it investigates how recent changes in digital media have influenced procedures and methods of creation and made possible the emergence of creative processes in networks and in a permanent state of fluctuation. The guiding objective of this article is to understand the characteristics of network creative processes as well as the movements of thought that compose the journey of production. The article is structured in three sections. First, we present the principles and fundaments which ground the research. Then, we propose a reflection on the paradigmatic models which define the creative processes in terms of their objectives, as well as their nature and the perspective of their questionings. The third part is dedicated to explore the digitally-mediated creative processes.

Key words: creation processes in digital media, criticism and theory of process, artistic poetics, design.


Initial considerations

This article proposes a possible cartography of the paradigms of processes of creation in digital media and dialogues with more extensive research we developed, as Professor of the Postgraduate Study in Semiotics and Communication Program at the Pontífica Universidade Católica of São Paulo, in the creative processes line of research. We worked in conjunction with Cecília Almeida Salles, and our scientific research activities propose investigations which articulate knowledge originating from theories and practice. The research moves along three axes: critical creation processes in various media expressions; critical accompaniment of creative processes, and works of collective ownership based conceptual propositions involving the creative process (Leão and Salles, 2011). The investigation of the stages that comprise the construction of a media product emphasizes theoretical and conceptual choices. Among the line of research can be cited: creation processes in diverse media formats; knowledge production in communication; dialogues with the concept of aesthetic experience and reflections about the concept of authorship[1]. Among our recent publications, we highlight “Archives of Creation: Art and Collective Ownership” (Salles, 2010) and “Digital Media Creation Processes: Passages of the Imaginary in Transcreation Aesthetics ”(Leão, 2010a).

Laan Mendes de Barros, claims the possibility of a displacement of the antagonism between theory and practice towards a “communication praxis”. In his argumentation, aiming to overcome this dichotomy, Barros reviews the meaning of praxis:

‘When knowing and doing come together, when practice incorporates critical reflection of what is being done, what one has is the exercise of praxis. The term praxis, in Greek, does not merely indicate the pragmatic dimension of production, appropriate of the term poiesis, more linked to technical crafting; it extrapolates the notion of practice, present in the term praktiké. Praxis, a term also found in Latin, implicates a thinking-action process, of conscious action, which incorporates values and implies insertion in historical time and social space. To think of praxis involves, therefore, consequential action, with meaning, significance’ (Barros, 2011, p.9).

As we shall see, the research on creative processes assumes a hybrid perspective, at the confluence of poetic experimentation and conceptual reflection. In other words, it is research towards praxis.

Principles of Research

We are going to present a brief summary of the conceptual guidelines which lay the foundation for our investigation, aiming to clarify the starting points in our research of the creation process. As we shall see, the explanations of the epistemological presuppositions are manifested not only in theories, but, mainly, in the practices which comprise the creation process. We have organized the three following logical propositions upon which our reasoning is based. These propositions have received the denomination of “principles” as they organize ad systemize the ways in which our research is performed.

The first principle proposes the creative processes be considered open interactive communication systems which include elements of diverse natures. Sociocultural context, media, values, individuals, groups, narratives, memories, dialogues, encounters, places and temporalities are some of the possible in these processes. It is appropriate to point out that these elements have dynamic characteristics and join relationships and forces. By adopting a systemic perspective, the study of creative processes assumes that the system is not simply the sum of its elements. This means the elemental characteristics considered individually appear to be different from the system when considered as a whole. Another consequence of this approach is that parts of the system establish a complex relationship of mutual implications, in which actions and reactions feed into each other. This property is referred to as “circular causality.” Finally, the systemic perspective requires a regulation precept, as the elements must share a minimum number of rules or conventions.

The second principle states that creative processes are networks in a constant state of transformation. This involves renouncing concepts such as origins and/or conclusion of a work. The topologies of the networks require that concepts such as hierarchy and linear organizational methods be abandoned. Understood from this viewpoint, creative processes are constituted as sets of moments with generative potential, trajectories with various versions in the development of a creative thought.

The third principle sustains that creative processes, due to their former characteristics as (1) open communicational systems and (2) networks in constant states of transformation, require a kind of research which is also in network and has systemic characteristics. In other words, reflection on the creation processes must be of a polyphonic nature in which a set of theoretical instruments from diverse disciplines communicate in an orchestrated discourse. In this sense, the conceptual body of research necessarily has inter and/or transdiciplinary characteristics.

Considering these three principles, we propose here a reflection on possible production models. The proposal we present makes use of a cognitive modeling procedure and has three matrices of communication theory as a foundation.

Production Models

Considering the communicational nature and perspective of its questioning, which are the matrix models that organize creation processes? We propose that creation processes in the media be studied on the basis of three possible conceptual models that are connected and revisit some theories of communication. These are: the informational model, the media model and the post-media model. They will be presented in three layers: theoretical framework characteristics; characteristics of the model and its application in creative processes in general; and a reflection regarding the presence of these models in digital media creation processes.

Informational Model

The first model presented comes from the classical informational vision, based on the emitter-medium-receiver (E-M-R) triad. Its objective is the transmission of content in the most precise manner possible. The linear informational paradigm, as it is also known, is established with the studies of mass communication media and defines those media as neutral, that is, mere information transmission instruments[2]. Thus, in this model, the medium should be transparent, in order to avoid interference in the communication process.

It is interesting to observe that this model is derived from the mathematical communication theory (Shannon and Weaver) that, paradoxically, is not concerned with the semantic level of communication. Shannon and Weaver’s model considers information in a totally different sense than communication sciences, as they use the information concept in a subjective way, capable of being encoded in signals (by the emitter) and decoded in signals (by the receptor). For this theory, information would be something concrete and exact. The mathematical communication theory was developed to be applied by engineers to the creation of telecommunication devices. While the aim was to design systems in which information could be transmitted efficiently, this theory was not concerned with the meaning of the information. Other points which set this theory apart from communicational studies include: the exclusion of contexts in communicational process analysis; the reduction the qualitative aspects of the process, such as noise and interpretative capacity; and the lack of interest in the characteristics of the medium, which are seen as neutral and given metaphors such as “canal”. Regarding the complex implications of the “mathematical communication theory” in communicational studies, see Klaus Krippendorff’s (2009) excellent text.

However, returning to the informational model, in the manner in which it is understood by the communication field, a hermeneutical tendency is observed, a centralization of studies in the scope of interpretations and search for meaning. In the words of Felinto (2011, pp.6-7):

‘As a discipline fundamentally concerned with the investigation of processes of meaning between emitters and receptors, communication was characterized as an investigation of hermeneutical order…From content analysis to reception studies, it is essentially about sense interpretation… This way, it is not surprising that traditional models of communication theory have almost always considered noise as something negative to be eliminated from the communicative processes […] The classical communicational conception engendered a kind of “communication metaphysics”, which has made us, perhaps, too confident in its efficiency and transparency’.

Media processes creation ruled by this paradigm start from the assumption that the focus of creation should be the message. The author(s) should impose his (their) mark on the material support, impress their dominance. In this sense the creative agent(s) are endowed with technical skill and material mastery of the medium specificities. This paradigm contains every manner of operating mechanically on matter, for example, in the processes of sculpting, carving, modeling, painting, etc. (Laurentiz, 1991, p.103). We can also place here all critical investigation which organizes creative processes on the basis of ability and mastery processes of material supports.

The applications of the informational model in the digital media creation processes are ample and cover projects which demand controlled operation of the system. When an e-commerce interface is developed, for instance, it is expected that the informational system work exactly as desired, avoiding any possibility of interference or virus. The same goes for internet banking and service projects. We can also observe the predominance of this model in the majority of videogame design projects. That is, in the creation process, the designer plans that determined actions by the user correspond to the specific reactions by the system. Such expectations should have maximized probabilities of occurrence and, therefore, in that sense, the prevailing logic in this kind of project is the same linear logic of the informational model.

Media Model

The second model inverts the focus of attention and is less interested in the meaning of communication (semantic level) and than in the characteristics of the medium. In this line of research, Kittler (1999) proposes the media to be considered from a “materialistic”, systemic and historical perspective. According to Wellbery, in his preface, Kittler establishes a possible research program for a post-hermeneutical critique. In this program, media is an inscription device, notation system and discourse network (Wellbery, 1999, pp.xii-xiii).

[1] See, regarding these researches, Salles (2003, 2010) and Leão and Salles (2011).

[2] See, regarding this model, the Albuquerque article (2002) that discusses how the consolidation of the communication field occurred through the “challenge of investigating a very particular set of communication technologies – those of radio and broadcasting”. In this sense, this implantation of this model, fundamental for the structuring of research, is bound to a specific moment as well as specific communication technologies. In this article, Albuquerque discusses how digital media destabilize the traditional model for research in communication.

The media model affirms and emphasizes the materiality of the media. Here, the medium is not transparent. On the contrary, it is seen as an entity actively inscribed in the communicational system, and due to its qualities, impresses meanings to the work and to the creative process. In Laurentiz’s reading (1991, p.102):

‘The concept of materiality does not oppose that of matter; it goes beyond it. Matter is the mechanical preoccupation with material support, whereas materiality covers the expressive potential and the informational charge of these supports, also encompassing the extramateriality of the information medium’.

Also according to Laurentiz, the operative acts of materiality are acts which occur in a cooperative context, in which the expressive qualities of the medium couple with the expressive force of the author(s).

The applications of the media model in the digital media creation process can be observed in several projects. Formally, all works which explore the potential of the media are included into this categorization. Here, it is important to consider digital media in terms of their specific material characteristics. In a non-exhaustive list of examples, we would have: a) works which operate with programming, so to say and software, scanning languages and codes and revealing generative potentials of the numeric-software art; b) works that articulate geographical localization information with network data systems – locative media art; c) works that speculate with information from the biology field and use digital media in life simulation processes – bioart; d) works which utilize the digital media’s numerical potential with the objective of generating dynamic data visualizations – infodesign; e) works that unveil automation systems and intelligent systems, producing objects from the physical world endowed with digital processing systems, hybrids – robotics, interactive objects, sentient objects; f) works that create immersive recreational environments and propitiate interaction in the media-based universe of games; g) works which make use of the communicative potential of digital networks in search of telematic processes and/or telepresence and create dialogical and/or collaborative environments. In short, our list could go on and include various subitems from poetic experimentations. But, for the purposes of this article, this summary systemization is a sufficient illustration of the multiple universes which permeate the field. The focus of this article is on the final category listed.

Post-media Model

We now turn to the description of a third possible model that engenders creative processes. In this model, which we call post-media, the projects exceed the characteristics of a determined medium and advance through territories of a plural nature. The post-media model is founded on the observation of works which do not rest neatly within the confines of any particular medium, but operate in hybridization processes.

The post-media term reintroduces a very rich discussion raised by Krauss in her book A voyage on the North Sea (1999). For Krauss, in contemporary art, artists pass through different tools and processes and seek to include expressive media heterogeneity. Thus, differently from other art periods, in which the artists centralized their production in a specific media and were known for this specialization, the post-media artists are not so limited. Krauss’ study caused a series of inquiries in several fields. One of the questions her proposition raises regards Krauss’s own media definition. De rigueur, works by artists such as Marcel Broodthaers (whom Krauss presents as an example of an artist in a post-media condition) are representative of media heterogeneity. However, Krauss’s proposition was quite successful in eliciting discussions and debates on medium specificities. With television, film and their expanded formats, videos and digital media, considering language purity is, to say the least, complicated.

What we are calling “post-media creation process” also evokes the remediation concept proposed by Bolter and Grusin (2000). In the book ‘Remediation: Understanding New Media’ they postulate that digital media recontextualize and approximate old media, like photography, music, television, text, etc. However, for Bolter and Grusin, this process has a double logic – while it is an act of media multiplication, remediation is also a media-deleting movement. This deletion can be observed in the dissolution of the awareness of the very role of media as founding elements of world visions. In this sense, Bolter and Grusin, when questioning the digital immersion experience, adopt McLuhan’s narcotics concept.

Our proposal for a process model for post-media creation is founded on persistent practices in digital media, but can also be applied projects operating in the passages between the media (Bellour, 1993, 1997). What is to emphasize in this model is that the processes which emerge from this perspective operate at the intersection of the informational and media visions. In this approach, the processes hinge as much upon media-specific characteristics (this is reflected in the conceptually based choices of media to be used) as on the contents of the messages to be discussed. In general, the contents and discourses (semantic level) organize the proposals in multiple media. In short, they are processes which operate with two intertwined goals. We can observe this kind of procedure in several projects. They are particularly present when they are subscribed in diverse circuits and assume a character of flux. As an example we can cite the Guaraná Power project from the Superflex collective. The project, which had political objectives and inserted “chips in the monolithic situation” of the drink distribution oligopoly, joined forces directly with an Amazon community of agriculturists and with those enlisted through various media campaigns (social networks, video, internet, t-shirts, etc). We are not going to deepen our analysis of this interesting project, as we previously discussed it more detail (Leão, 2010b).

To discuss the presence of the post-media model in relation to digital media practices, it is necessary to first consider the dynamic nature of this model. Thus, projects that, despite making use of digital media, are not restricted to any specific media are examples of post-media processes. These are projects that are articulated in the media traffic, running through several mediatization processes. Let’s take a look at some examples.

“Vista On Vista Off # 2”, the artist Denise Agassi’s network instalation invites us to an exercise of expanded observation through communications networks and online databases. Composed of a central device which provides the main idea, the project offers us a point of view that travels along a planispheric view of the Earth and, thus, through a representation of entire terrestrial surface as a rectangular plane, the system leads us to geographical points. In the creation process, the artist opted for a system in which the points correspond to “links” that point to YouTube videos. In this sense, the project consists of accessing online databases. Interacting with the system leads us to choose geographical locations. Similar to a compass, the act of turning the device corresponds to the act of pointing to a determined coordinate. Thus, the cardinal directions, north, south, east and west reappear as “codes” which activate process of displaying videos.

“Catavento”, a project by Gilbertto Prado, Silvia Laurentiz and Grupo Poéticas Digitais[3] from the School or Arts and Communication at the University of São Paulo, is an interactive instalation that switches between several media and projects generative digital images in public spaces. The project works with a weather station that captures atmospheric information related to humidity, temperature, wind direction and speed. This digital data feeds into an analytical system that produces images of clouds, which are then projected into the public space. The wind data directly affects the visual composition of the project. The cloud images are generated by a particle system normally used for simulating natural phenomena, such as fire, water, clouds, etc. An algorithm was developed to visually represent “snowflakes” inside the word “sky”. According to the wind variance (more or less wind) the word “sky” fades to a greater or lesser extent, until it completely vanishes and reappears moments later. The wind direction is also translated into visual stimulus, causing the word “sky” to move in various directions.

Collective Creation Processes in Digital Media

We shall now take a look at a possible matrix organization in an effort to understand the logic that operates in digital creation processes. Specific attention will be paid to creation processes that are carried out in digital networks. In accordance with the cartography of creation processes we present in the current article, these projects are placed in the media model (that is, they explore the materiality of the media) and are categorized as type “h” experiments, as they use the communicative potential of digital networks, aiming to create dialogical and/or collaborative environments.

The collective creation processes in digital network is organized in three categories which are defined according to the procedural logic that validates it. As they refer to creation processes, they cannot be regarded as “finished work”. On the contrary, the projects we chose to analyze here are characterized exactly for their opening nature and being though constant transformation.

Associative Processes

In this category are projects which allow and stimulate free movement of thought. Inheritors of common practices in processes of collective creation, such as “brainstorming”, the projects in this category aim to create spaces that receive the flow of contributions and collect varied input. The emphases of these projects, or better said, their primordial interests, are the connections, the establishment of networks and the creation of space for dialog. In this sense, they propitiate approximations between people from different fields. In summary, they are data sharing processes mediated by rules and systemizations established by the community. In this category we find platforms like Delicious, Twitter, Flickr and YouTube, which permit the sharing of the addresses of favorite sites, messages, photos, and video, respectively.

Although these systems are founded on free data sharing, it is worth mentioning that they possess a minimum level of regulation that organizes their practices. In the case of YouTube, for instance, there are norms concerning the sort of content that can be published in the terms of service documentation (community directives). This normalization cautions the owner that his account is responsible for the contents which are published in his name and he is obligated not to display copyrighted material. YouTube assumes that all published material is of the account owner’s authorship and that said author concedes all rights to the platform. Beyond this, a series of instructions establishes limits in prohibiting media products of prejudicial mature, i.e. sex and nudity, defense of hatred, illegal acts, etc.[4]

Ploject Processes

We denominate as “project processes” platforms present in the World Wide Web which, besides the characteristics indicated in the previous category (that is, data sharing), establish collective actions goals. Furthermore, in these cases, the structuring of phases and stages, as well as the determination of materials, media and methods is also observed. Wikipedia and Overmundo are some examples of processes which operate on this nature of logic. Whether the goal is the organization of information in a free-access encyclopedia or a collaborative site focused on Brazilian culture and the culture produced by Brazilians all over the world, this kind of project is characterized by always being in discussion among the members of the community. In the same way, its norms and procedures are constantly being revised.

The “open source” movement is also part of this category, as is utilizes the communication networks in its processes of creative development. The specific case of the “open source” movement involves a wide range of projects (including, but not limited to, software) and includes a systematization of collective creation procedures and methods of sharing (Delanda, 2011).

Translation Processes

Frequent in digital networks are projects which aim to aggregate procedures and content from different platforms. In this sense, they operate as mediators between different nodes of the network. Some of them, in the same way as language interpreters, propitiate conversational and multiple contribution spaces. Founded on what Manovich (2001) called “databank aesthetics”, the translation processes appropriate and reconfigure applications, output and files from the networks to compose their proposals. The examples from this category work with recoding, appropriations, remix and reinterpretation. Mash-ups are also inserted in this typology, projects comprised of an agglutination of elements with content from different sources with the aim of creating a diverse application. At first, mash-ups are websites which use data obtained from content providers (or APIs). It is possible to find mash-ups with APIs from different applications: Google Maps, Flickr, YouTube, Twiter, etc. A research study on projects of this nature reveals an enormous quantity of applications (see for example, “ProgrammableWeb.com”). Let’s see some examples:

TagGalaxy is a mash-up which operates with data originating from Flickr. It is possible to access images through the choice of a tag. As is known, tags are indexing data systems which can be customized by the user. Present in the Web 2.0 universe, the tags revolutionized the way of organizing and accessing digital information, as they do not utilize a fixed hierarchical structure. In the TagGalaxy case, the process of interacting with the system offers us an opportunity to articulate data in dynamic three-dimensional, circular visualization generation reminiscent of images of planetary systems and constellations. The size of the sphere corresponds to the quantity of the images located in the Flickr databases. With each tag searched, a galaxy of related tags unveils the associative networks among the images. Clicking on the searched-for sphere, an animation presents the database images. This project indicates characteristics which we judge to define a collective network creation process. The first one relates to the fact that TagGalaxy does not exist as finished work, but as a dynamic data visualization process. In this sense, it operates with combinatory logics and their potentialities, updates itself at each choice made. The interaction of the user can occur in a deeper level as it is possible to feed the Flickr databank.

The use of an interactive map with points related to the geographical location data (latitude and longitude) and an image databank originated from a historical patrimony are the starting points of an “Old S.F.” Mashup project that operates with the Geocoding Google API, the “Old S.F.” is a website which offers an interactive map of San Francisco, California, that can be accessed in different historical moments. Navigation occurs through a timeline that comprises the 1850-2000 period. In each date of this period, there are points on the map indicating the number of photos available. The project comprehends the visualization of 16.000 photos, originated from the San Francisco Public Library Historical Photography Collection. Interestingly, this project makes possible the travel though the city’s past, at different times, as we were unveiling palimpsest layers. The project invites collaboration and allocates the archives with the images’ description and the geocode points of the maps.

[3] [Digital Poetics Group] Andrei Thomaz, Claudio Bueno, Daniel Ferreira, José Dario.

[4] See details of the terms at: http://www.youtube.com/t/community_guidelines?gl=BR&hl=pt.

The poetics which work with the databanks explore the creative potential that dwells the digital languages core. The processes, when dealing with complex, nonlinear systems, operate crucial issues of the combinatory analysis. What are the process control limits? How does the system programming interfere in the data update? How does the “tags” system fitter and choose the images that are going to be veiled and unveiled? These, among other questions emerge in processes of this nature. Even more, makes us reflect upon the aspects of the contemporary culture and the data endless organization and reprogramming. As clearly put by Manuel Delanda:

‘Our world is not only governed by the nonlinear dynamics, which makes predictable execution and control impossible, but also the nonlinear combinatory analysis, which implies in possible mixing numbers of networks and hierarchies, of command and market, of centralization and decentralization, the ones we simply cannot predict are huge and the emerging properties from these combination, endless’ (Delanda, 2000, p.273).

“Your life, our movie” project by Fernando Velázquez, Bruno Favaretto and Francisco Lapetina is a piece that travels along the databanks aesthetics and operates translations and remixing with files and digital images. Proposed in different platforms, a site and a multimedia interactive exhibit, the project was thought as a generative process that uses the Flickr databank. In this process, a real time visual narrative with images from the internet is generated. Visitors of the expositive space participate by typing words in the system. As interaction happens through the internet, the process is the same and consists of the choice of the word. A programming searches Flickr files that receive this tagging. Three selected images are remixed with audio files. The typed words are also the elements which compose the generated video, establishing unexpected relations. After some time without interaction, the system starts to work automatically, bringing other words and corresponding files. In this dynamic, the apparent associative “random”, generated by the algorithmic logic, aspects of the surrealist poetics of the automate writing and the potential poetry are revisited.

Final Considerations

In this article, we tried to draw a possible cartography of the collective creation processes which happen in digital networks. In order to do so, we set off from the research guidelines we made in creation processes. Inserted in an academic environment which traditionally is interested in the analyses of the finished product, or epistemologically - based approaches, it is essential that we point out the principles of the research of theoretical-practical nature. As we could observe, research on creation processes is directed towards praxis, that is, the practice moved by a conscious thought of its models and choices. In this sense, aiming to contribute with this praxis construction, we set ourselves to the task of reflecting on the conceptual models that corroborates the creation processes in media. In our analysis, we could evidence the presence of models originated from the communication theories. These models work as meaningful lenses which structure visions of the world and activate creation processes. We defined three models (informational, media and post-media), pointed out their characteristics, applications on the creation processes in several media and specifically in processes performed in digital media. From this model definition, we situated the collective creation processes in digital media and proposed a discussion about their characteristics. Conceived as systems, open networks in constant transformation, these processes reveal their specificities. We expect the typology of processes we proposed in this article can contribute to the reflection about the methods and procedures which runs through the digital media experimentations.

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