Sérgio Amadeu da Silveira é doutor em Ciências Políticas e professor da Universidade Federal do ABC. Coordenador do Grupo de Pesquisa Cultura Digital e Redes de Compartilhamento. Foi presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação e membro do Comitê Gestor da Internet no Brasil. Pesquisa relações entre comunicação e tecnologia, sociedades de controle e privacidade, práticas colaborativas na Internet e a teoria da propriedade dos bens imateriais.
Marcelo Tramontano é Doutor e Livre-docente em Arquitetura e Urbanismo, com pós-doutorado em Arquitetura e Meios Digitais. Professor Associado e pesquisador do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAU-USP), onde coordena o Nomads.usp, Núcleo de Estudos de Habitares Interativos. É editor-chefe da revista V!RUS.
Como citar esse texto: SILVEIRA, S. A.; TRAMONTANO, M. Fortalezas do pensamento não podem ser destruídas por bombas. V!RUS, São Carlos, n. 13, 2016. Disponível em: <http://143.107.236.240/virus/virus13/?sec=2&item=1&lang=pt>. Acesso em: 22 Dez. 2024.
Marcelo Tramontano: Sérgio, o que é notícia?
Sérgio Amadeu da Silveira: A ideia de notícia nasce muito vinculada à ideia de imprensa, simultaneamente à emergência da imprensa na modernidade. Por sua vez, a imprensa surge como algo fundamental para a sociedade de massas e para a emergência dos Estados nacionais. A notícia é, assim, a produção de informações realizada por alguém. Em geral, nas sociedades dominadas exclusivamente pelas mídias de massa, as notícias eram produzidas por corporações que tratavam de dar prioridades para algumas informações e não para outras. Pautavam a sociedade, organizavam aquilo que a sociedade deveria saber e discutir. Isso é notícia.
A ideia de notícia vai se alterando com o surgimento das redes sociais online. Aliás, até mesmo antes disso, quando emerge a Internet, e ocorre uma inversão do fluxo informacional. Aqueles que antes conseguiam ter canais para falar amplamente, como o rádio, a televisão, o jornal impresso, passam a disputar com uma rede distribuída, que é a Internet, que não teve uma única fase, mas que permite que as pessoas criem suas notícias também. O difícil, na Internet, não é transformar um fato em notícia. O difícil não é falar, não é postar um vídeo, não é argumentar. O difícil é ser ouvido, é ser visto. Passamos, então, de uma economia da disseminação, da difusão, para uma economia da atenção. A Internet inverte o jogo. Muitos passam a disputar a possibilidade de criar notícias. Claro que não somos ingênuos de achar que os grandes grupos que já existiam no mundo industrial não se reposicionaram, adentrando as redes e também conseguindo pautá-las mais do que um cidadão comum. Há uma assimetria muito grande na distribuição da informação, por mais que tenha existido uma inversão do ecossistema informacional com a emergência da Internet.
Por outro lado, a grande mídia, os grandes grupos de poder, já não tem tanta facilidade de abafar e controlar informações como tinham no mundo industrial, um mundo controlado pela mídia de massa. Eles têm, agora, que enfrentar uma profusão de coletivos, de mensagens, e a qualquer momento uma pessoa comum ou um grupo menor pode trazer uma informação que se transforma em notícia e acaba ganhando repercussões gigantescas nas redes digitais. Nem mesmo o poderoso Estado norte-americano conseguiu impedir que um grupo diminuto de hackers, jornalistas e ativistas, reunidos em torno do Wikileaks, divulgasse documentos importantes que desmascaravam o discurso oficial do Estado mais poderoso do mundo. Temos, então, um jogo da produção de notícia, hoje, na Internet, muito mais rico e diversificado que antes, mas que não destruiu as assimetrias de poder.
No universo dos blogs, por exemplo, antes do surgimento de algumas redes sociais, em particular do Facebook, o jogo era mais democratizante, menos controlado do que a produção de notícias dentro dessas redes. Por quê? Porque o Facebook efetivamente controla a visualização de uma informação. Para atingirem amplamente o público que elas querem atingir, as pessoas têm que contar com a benevolência dos algoritmos do Facebook ou têm que pagar pelo serviço. Dessa forma, dentro da Internet, que é uma rede distribuída, essa rede social verticaliza novamente os fluxos de informação. E ela devolve ao Capital o grande poder que ele tinha no mundo da mídia de massa, no qual as grandes corporações, com um volume gigantesco de recursos financeiros, podiam fazer propagandas, colocações, comprar edições de jornal.
No caso do Facebook, percebe-se que grandes grupos econômicos, grandes corporações, políticos com muito dinheiro, passam a pagar para obter mais visualizações de suas informações. Nesse novo terreno das redes sociais onde notícias são produzidas, divulgadas, disseminadas, compartilhadas, o Facebook guia-se por critérios completamente obscuros, por definições de algoritmos que nós não controlamos, comandados por um grupo privado que controla a plataforma onde ocorrem amplamente debates e a disseminação de informações. Hoje, a notícia é disputada na Internet. O jogo ficou mais complexo e, por haver diversos grupos que disputam suas verdades na rede, que disputam o que noticiar e de que ângulo noticiar, nós talvez tenhamos a sensação de que estão existindo enfrentamentos muito intensos, que antes não existiam.
De fato, no mundo dominado pela comunicação de massas, enfrentamentos tão nítidos não eram visíveis, pois poucas pessoas tinham o poder de fala como hoje. Nós não podemos ser românticos e achar, como querem alguns, que, antes da Internet, existia um debate habermasiano, voltado ao entendimento, e que esse debate deixou de existir. No mundo da mídia de massa não havia debate algum, ou havia apenas o debate consentido. Agora, existem enfrentamentos, ou pouco debate e muito enfrentamento. Mas nem por isso devemos achar que se trata de uma situação onde somente o ódio prevalece. Percebemos, sim, que estamos vivendo um período no qual valores que muitos acreditavam estar consolidados na sociedade, não estão. E é bom que isso fique claro. Eu acho extremamente positivo percebermos que ainda temos muito que avançar na chamada defesa da diversidade, da tolerância, do respeito ao outro. E que, na verdade, a tolerância e o respeito à opinião do outro são elementos-chave para se estabelecer uma sociedade democrática, centrada na diversidade e não no pensamento único.
Por outro lado, estamos vivendo, em paralelo, o culto ao pensamento único e às formas excepcionais de poder. O teórico e filósofo italiano Giorgio Agamben disse, há muito tempo, que estávamos vivendo um novo paradigma de governo baseado na exceção. No seu livro “Estado de exceção”, ele começa discutindo o 11 de setembro e, em seguida, trata do homo sacer, uma figura estranha existente na Roma Antiga. Ele vê surgir essa figura a todo momento, no nosso quotidiano atual, em diversas regiões do mundo. Agamben acredita que ela constitui a exceção e que, para defender a lei, é preciso sempre violá-la. Para defender a constituição, para defender os bons, os justos, alguns acreditam que o poder tem que agir excepcionalmente. Essa lógica passa a ser um paradigma de governo, amplamente defendido. Ao constatarmos que essa lógica do Estado de exceção ganha corpo em um determinado pensamento que temos atualmente no Brasil - uma espécie de neofascismo -, percebemos que nunca olhamos com a devida atenção para um certo discurso de entretenimento baseado na espetacularização do crime. Esse discurso exagera os conflitos que acontecem na nossa sociedade, partindo da compreensão que um conflito é um absurdo e que, portanto, se há conflito, há crime. Nós temos que dar um basta nisso.
Há uma profusão de programas de violência policial, exibidos na televisão, que cultuam a lógica da exceção. "A lei é para defender bandido". Esse pensamento está sendo colocado há muito tempo. Essa colocação tem uma estética, uma estética da violência e da polícia, do Estado policialesco, e toda estética é portadora de valores, toda estética traz ética. A ética que esses programas cultuam é completamente totalitária, é uma ética que desconhece os conflitos, os confrontos sociais, que desconhece as matrizes que levam a esses confrontos. Ela simplifica soluções, como se a causa de existirem criminosos fosse o fato de a polícia não agir com o devido rigor. Isso quereria dizer que, se agirmos com o devido rigor, não haverá mais crime. Essas lógicas simplistas proliferam juntamente com valores da sociedade que também deixamos de considerar nas nossas reflexões. Vários pensadores até consideraram, mas eles situavam-se um pouco à margem do grande debate filosófico das ciências sociais, que é a questão de o nosso país ter convivido, nos seus pouco mais de 500 anos de vida, com 400 anos de escravidão. Essa questão deixou marcas profundas na nossa sociedade, que não foram enfrentadas.
Durante a maior parte do século XX, convivemos com regimes autoritários no nosso país, com golpes e ditaduras, e agora, no século XXI, temos um novo golpe. Alguns dizem que o que estamos vivendo não é um golpe, pois não há participação dos militares. Para quê militares? Os militares não precisam pôr tanques na rua: a polícia já é militar. Nós nunca enfrentamos a militarização oriunda da ditadura militar, que continuou nas ruas tratando as periferias como áreas de ocupação, considerando que, ali, não há população, mas criminosos acobertados nas favelas, nas casas, nos cortiços. É esse o pensamento desses policiais. Não é à toa que eles chamam de "unidade tática", ROTA, ou coisa que o valha, seus veículos com quatro homens fortemente armados. Eles constituem tropas de ocupação nas áreas periféricas. Em nenhum momento isso é polícia. Polícia é uma atividade civil, uma atividade de defesa da sociedade, uma atividade que, inclusive, enfrentou polêmicas para instalar-se em Londres, por exemplo. Há, enfim, todo um debate sobre o que é uma polícia. Mas no Brasil não existe esse debate. Polícia aqui é, na verdade, uma tropa de ocupação. E se, em 1964, foi necessário colocar tanques nas ruas para mostrar a força do militarismo, hoje, basta colocar a ROTA na rua.
O governador de São Paulo coloca a polícia nas ruas para agredir jovens estudantes, o que gera uma situação muito interessante. Alguns juízes não permitiram que a polícia fizesse reintegração de posse com adolescentes, menores de 18 anos nas escolas [públicas de primeiro e segundo grau ocupadas]. Para evitar que essas ordens judiciais passassem a ser proferidas atrapalhando os planos de fechamento de escolas do seu governo, o governador coloca como Secretário da Educação um juíz, ex-desembargador do Tribunal Superior de São Paulo. E por que ele faz isso? Exatamente porque o seu partido político, que organiza hoje, no Brasil, a principal ação de supremacia total do mercado, de totalitarismo mercantilizador, traz uma nova face do velho autoritarismo, que entende questões sociais como caso de polícia, mas com uma nova roupagem. Tudo isso tem raízes em valores que nós não tratamos na sociedade.
É claro que estamos vivendo uma onda conservadora no mundo todo. As alternativas dos Estados Unidos não eram boas: Donald Trump contra Hillary Clinton. A alternativa boa que eles tinham, à esquerda, democrática, não conseguiu vencer as prévias. Na Espanha, tinha-se uma esperança muito grande no Podemos, que, na verdade, não tem conseguido avançar como acreditávamos que avançaria. A própria direita se organiza e dá uma nova cara para o Ciudadanos e outros grupos que também disputam um novo discurso. Mas sabemos que esse novo discurso é, na verdade, o velho recado totalizante. No mundo inteiro, tem havido um recrudescimento de valores antidemocráticos, vamos dizer assim. Não há, portanto, uma grande surpresa na afirmação de que o que estamos vivendo, no Brasil, é um renascimento de discursos que talvez nem precisassem renascer, pois estavam ao nosso lado o tempo todo. As nossas camadas economicamente dominantes - as classes média e média alta - não conseguem conviver com a diversidade durante muito tempo. Eles não querem direitos, querem privilégios.
Marcelo Tramontano: Há, ainda assim, uma certa surpresa nesse processo que você descreve e que resultou em um golpe de Estado, esse ano, no Brasil. É o apoio que esse golpe recebeu de grupos sociais historicamente oprimidos, incluindo muitos habitantes de periferias pobres. Por outro lado, houve - e há - uma manipulação na construção de notícias e na divulgação de informações por parte de grandes empresas de comunicações visando moldar opiniões, desacreditar seus adversários e induzir ações da população. Você vê uma relação entre esses dois fatos?
Sérgio Amadeu da Silveira: A maioria da população das periferias não se mobilizou com o que nós estamos qualificando como golpe. O que houve mesmo foi, principalmente, uma manifestação das camadas médias. Pelo menos nos lugares onde eu acompanhei, como São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, essa mobilização foi fundamentalmente da classes média e média alta. É, no entanto, igualmente surpreendente que essas camadas médias tenham aderido a isso. Dentre as causas dessa adesão, eu vejo o fato de que os valores democráticos, da convivência com a diversidade, a aceitação de que o trabalho é nobre e deve ser respeitado, mesmo para aqueles que realizam trabalhos manuais, não foram muito bem incorporados por essas camadas. Elas defendem a ideia da casa grande contra a senzala, e de que quem trabalha não merece respeito. O discurso do trabalho enobrecedor só é usado de uma maneira mítica. Na prática mesmo, no dia a dia, as elites e as camadas médias que se projetam nela não aceitam direitos básicos dos trabalhadores.
Um exemplo disso foi a grande virada ocorrida, em 2012 ou 2013, quando outorgaram-se direitos mais concretos às empregadas domésticas, no Brasil. Foi um turning point para a classe média. Muitas pessoas ficaram indignadas porque tinham aquela compreensão aristocrática: "eu faço parte de uma certa camada social, pago uma pessoa como serva, então nós não temos uma relação integral de trabalho: ela faz favores, eu faço favores". De acordo com essa maneira de pensar, o patrão doméstico se vê como superior à empregada e vê como uma concessão o fato de "até mesmo deixar essa pessoa dormir na minha casa”. Essas coisas são muito fortes, e quando se começa a mudar a estrutura social do país, afeta-se essas camadas médias que se rebelaram contra a mínima distribuição de renda ocorrida no país. Foi uma pequena distribuição de renda, em um período de tempo muito curto.
Por outro lado, houve uma penetração muito grande da ideia, muito difundida pelo próprio governo Lula, de que o importante é incluir mais parcelas da população nas práticas de consumo. Ou seja, o mercado continuou a ser o epicentro da sociedade. Organizaram-se movimentos culturais importantes nas periferias, mas que, de certa maneira, colocam-se no mesmo sentido de supremacia do mercado. Por exemplo, o movimento do funk ostentação, que é o culto ao dinheiro, ao consumismo: alguns pesquisadores vêem esse movimento em uma perspectiva positiva, que seria a da periferia também reivindicando seus direitos. Eu tendo a achar que não são exatamente direitos que eles querem, mas dinheiro para consumir. E a lógica do consumo não se baseia em direitos, mas na mercadoria, em ter poder de compra. Mas aí pode-se perguntar: "mas isso não é a mesma coisa que a luta sindical?" É claro que não! A luta sindical é uma luta em que buscamos direitos de remuneração razoáveis para que todos nós, da nossa classe, possamos ter um padrão de vida decente, melhores condições de vida e de trabalho. O que o funk ostentação cultua é o individualismo exacerbado, que acredita no poder total do dinheiro. Essa lógica não é muito positiva para quem defende que é preciso superar adversidades no país, que temos que ter solidariedade, que o mercado não é tudo, que nem toda lógica deve caminhar para o contexto da competição. É preciso cultuar também a colaboração, o compartilhamento.
Eu penso que muitos dos segmentos que aderiram a essa onda puxada pelos conservadores e pela mídia mais forte vão rapidamente se desgastar e gradativamente desgarrar-se dela, porque as suas condições de vida vão piorar. Mas, hoje, nas periferias, não há mais o trabalho político das esquerdas organizadas. Há, no caso de São Paulo, a disciplina imposta pelo PCC [Primeiro Comando da Capital, organização criminosa], que é quem faz de fato a justiça das pequenas causas nas periferias. Não há mais comunidades eclesiais de base, e sim igrejas evangélicas. Elas têm uma relação com o fiel de controle político que a igreja católica nunca teve. Não existe ali um enfrentamento de valores. Ele existe no movimento estudantil dos jovens que estão ocupando escolas, no movimento por habitação, mas que precisam avançar muito mais.
Marcelo Tramontano: Vamos aprofundar isso um pouco. Por um lado, há décadas que, particularmente no Brasil, a imprensa corporativa - televisiva, impressa, radiofônica - desempenha um papel muito importante na formação do que alguns chamam de opinião pública. A comunicação de massa utilizada por esses meios, um modo de comunicação "de um para muitos", contrasta com a comunicação distribuída das redes online, "de muitos para muitos", e que pode, como você disse, ser mais democrática. No entanto, o Estado e, individualmente ou em grupos, seus agentes - nas esferas executiva, legislativa e judiciária - também tem cada vez mais utilizado as redes online procurando moldar a opinião pública.
Sérgio Amadeu da Silveira: Na minha opinião, estamos vivendo uma situação de reagrupamento daqueles que têm a vocação de atuar pelas transformações sociais. Vemos, por um lado, uma ofensiva dos setores mais reacionários, que conseguiram arregimentar as camadas médias. Estes setores têm uma grande força. Eles usaram muito as técnicas de redes [sociais online], usaram muitos recursos publicitários, e, efetivamente, usaram linguagens de mobilização das redes. Isso é bastante curioso, porque algumas pessoas tinham a ilusão de que as redes digitais eram, em essência, colaborativas e sempre no sentido democrático. Isso não é verdade, pois, já há algum tempo, as redes foram inundadas pelas corporações e pelo pensamento único. Não temos nenhuma ilusão em relação a isso: as redes também são terreno do Capital.
As redes, no entanto, permitiram o surgimento de vários coletivos rebeldes, agindo no exercício de contra-poder, de enfrentamento dos regimes de verdade estabelecidos pelo Estado. Mas isso tem sido feito em um ambiente ambivalente, com tecnologias ambivalentes. Temos aí, portanto, um enfrentamento no qual a esquerda mais tradicional só agora percebeu que ela terá de se preparar para um embate discursivo de grande intensidade, contínuo, que é o que acontece nas redes. O que consolida o golpe atual, no Brasil, é uma fusão do poder judiciário - que, no Brasil, há muito tempo, é um poder dos coronéis, dos filhos de fazendeiros, dos filhos dos banqueiros, da elite da elite - com uma operação midiática. Sem que se criassem teses como a do domínio de fato, sem que se fizesse uma seleção do que olhar e não olhar, sem que se fomentasse, portanto, uma postura seletiva, não se teria conseguido implementar toda essa operação que mobilizou grande parte do país contra um governo instaurado. Não se teria conseguido que a população não se rebelasse nas ruas, de maneira massiva, em favor de um governo que estava sendo deposto.
Porque, de fato, as mobilizações da maior parte da população foram de opinião. Não houve uma indignação massiva contra o mecanismo fraudado que eles fabricaram para derrubar o governo. Não houve uma indignação colocando em xeque essa atitude. Foi realizada uma operação judicial-midiática que incluiu o aparelhamento do poder judiciário pelo grupo político que controla o Estado de São Paulo, o Ministério Público e os principais cargos do poder judiciário em Brasília. Incluiu o [juiz do Supremo Tribunal Federal] Gilmar Mendes, que, por dominar aquela máquina, faz política através do Poder Judiciário. A ponto de o Brasil ser um dos poucos países do mundo onde os juízes são famosos como personalidades políticas. Isso significa a falência do sistema democrático. No Judiciário, o juiz deve falar pelos autos, pelo processo. Aqui não: o promotor - que não é do Poder Judiciário mas constitui uma função essencial da Justiça -, produz e veicula um powerpoint motivacional [contra um adversário político, o ex-presidente Lula] que não contém uma única prova concreta. Aquele promotor não fez isso focando os autos, e os advogados sérios dizem que aquilo foi um acinte. O powerpoint que o [promotor] Dallagnol apresentou, em Curitiba, para demonstrar que o ex-presidente Lula era chefe de uma quadrilha tornou-se imediatamente um meme e até estimulou o surgimento de powerpoints irônicos, semelhantes, nas redes sociais. Aliás, foi incrível ver, mais uma vez, o humor sendo usado como arma política nas redes sociais. O promotor fez aquilo sem apresentar nenhuma prova porque ele não queria falar para o processo: ele queria falar para a rede Globo de televisão. Tanto isso é verdade, que a rede Globo interrompeu sua programação normal para dar voz ao promotor em seu ato teatral.
O que se conseguiu provar contra o suposto “chefe da quadrilha” [ex-presidente Lula]? Ele teve seu sigilo fiscal quebrado, teve a vida devassada, e apenas foi encontrado o que todos vimos: um sítio que não é dele, um apartamento que ele ia comprar mas não comprou, e um barco de lata. Essa é uma articulação típica das camadas dominantes brasileiras. Elas já fizeram isso no golpe do Estado Novo, quando Getúlio Vargas implantou uma ditadura e quase decidiu apoiar o Eixo, o Nazismo [na Segunda Guerra Mundial]. Nós temos uma história ruim com essas elites, e, hoje, elas estão aí, com um fascismo de boutique. Nesse fascismo de boutique, perfumado, intelectuais como o [ex-presidente] Fernando Henrique Cardoso pretendem dar um golpe dentro do golpe. Parte dos autores do golpe estão querendo recolocar Fernando Henrique Cardoso na presidência, que seria eleito indiretamente pelo Congresso Nacional, para que ele realize aquilo que é, na verdade, o projeto deles: ser a vanguarda do totalitarismo de mercado.
Vou explicar melhor essa expressão. Nos anos 1980 e 1990, o mundo, em geral, e o Brasil, em particular, tinham setores econômicos altamente lucrativos, formados e mantidos pelo Estado: os setores de telecomunicações, de energia e de transportes. Esses três setores são altamente lucrativos até hoje, e foram tirados do Estado. O argumento neoliberal era: "temos que tirar esses setores do Estado, pois o Estado tem que ser mínimo e não pode dar prejuízo". Mas esses setores foram tirados do Estado e o Estado não diminuiu de tamanho. Seus percentuais em relação ao PIB continuaram mais ou menos iguais. O que aconteceu? Por que aquela privatização foi necessária? Porque o Capital tem tendência expansiva, precisa reproduzir-se com mais força, e os setores financeiros apostaram muito em energia e telecomunicações. Onde está, agora, a fronteira da privatização que pode ser altamente lucrativa? Está nos setores de saúde e de previdência, e também na educação, se o setor público de educação for desmontado. O raciocínio é: "Afinal de contas: para que ficar financiando universidades federais se podemos comprar vagas em estruturas privadas do grupo Kroton, como quer o sr. [Jorge Paulo] Lemann?". Os neoliberais visam efetivamente esses setores, e nem é preciso mencionar a previdência. Destruindo a previdência pública, obtém-se um setor onde se poderá lucrar enormemente, e o Estado fica de retaguarda, como em qualquer lugar do mundo: quando essas empresas quebram, o Estado vem socorrê-las. Na verdade, o Estado mínimo, como dizem vários pesquisadores, é o Estado máximo de apoio ao Capital.
Essa política é desenvolvida na contramão de quem quer fazer distribuição de renda. Uma pessoa de uma cidade do interior de São Paulo - que é um Estado bem rico -, que tem, por exemplo, um pai que ganha um salário mínimo ou que trabalha na roça, que estuda em escola pública rural, terá poucas chances de ascensão social. A escola é ruim, os salários dos professores são baixos e o governador ainda assim quer fechar escolas. O governador neoliberal de São Paulo não paga salário decente para professor do ensino fundamental e diz que salário não é importante - só é importante para ele, para a família dele, para os juízes e para os capitalistas, mas para o professor, salário não é importante. Veja que ironia. Esse menino, essa menina, que está no interior do Estado mais rico do Brasil, tem um futuro muito pouco alvissareiro pois não terá nenhuma oportunidade. Mesmo que tenha, as oportunidades não são iguais para todos porque há um funil violento. Acontece que políticas distributivas, que também vêm no sentido de dar novas possibilidades subjetivas para essa juventude, precisam também ser construídas com o Estado. O Estado mínimo a favor do mercado máximo é contra isso e precisa, portanto, de fascistas de boutique, que estão operando essa ação contra o despertar criativo da nossa população, contra as práticas colaborativas que podem trabalhar um outro tipo de futuro, contra as buscas de novas formas de convivência. Eles estão aí, com essa verdadeira noopolítica, nos dizeres do Maurizio Lazzarato.
Eles não querem mais só controlar o corpo. Eles não têm apenas uma biopolítica que os Estados vêm fazendo desde o século XIX. Agora, eles têm uma política para o pensamento. E, segundo essa política para o pensamento, a dissensão e o debate contra ela devem ser criminalizados. Não é à toa que os deputados de direita apoiam o projeto conhecido como "Escola Sem Partido", porque eles acreditam que o debate precisa ser demonizado. A diversidade não é boa para o mercado total. O mercado total, nos dizeres de Gilles Deleuze, é uma matriz de pensamento, uma axiomática do Capital que estamos vivendo. Já vivemos essa axiomática há muito tempo, mas agora vemos a sua expansão. E é muito interessante perceber que ela se dá na plataforma de redes sociais também.
É preciso atualizar autores como Guy Débord, que tratava da sociedade do espetáculo, uma sociedade visual. O que era, no fundo, a engrenagem mestra da espetacularização? No meu modo de ver, era a mercantilização exacerbada que Débord já percebia nos anos 1960, imagine agora! A Internet não reduziu a sociedade do espetáculo: ela ampliou a espetacularização. E ela atinge as subjetividades de uma maneira brutal. Assim que conhecemos alguém, hoje, vamos logo ao Facebook ver o perfil dessa pessoa. Se ela não tem perfil no Facebook, nem no Instagram, nem no Twitter, já achamos que ela é agente da CIA, porque ela não existe, ela é um robô! Essa situação representa uma pressão diferente do totalitarismo do Big Brother, pois aqui se trata de um totalitarismo distribuído. Essa é a questão que estamos vivendo hoje e que precisamos enfrentar.
Por outro lado, uma grande onda de percepções novas tem nos movido. Isso é muito bom. É claro que nós sofreremos muito, e as populações em situação de risco, mais pauperizadas, também sofrerão muito. Mas acho que vamos ter que realizar mudanças profundas em nosso país. Não podemos mais abandonar as mudanças de valores, como abandonamos as mudanças ocorridas nas ideias de direitos, de respeito. Tampouco eliminamos a polícia militar. Estive em uma manifestação recentemente na qual as pessoas gritavam: “Não acabou / Vai acabar / Eu quero o fim da Polícia Militar”. As parcelas da população que não têm uma aproximação com essa lógica podem achar que aqueles manifestantes são contra a polícia, pois a polícia, para elas, é a Polícia Militar. Na verdade, eles estão dizendo que são contra a militarização da polícia, e não contra a polícia. Mas essa ideia não é popular, as pessoas estranhavam quando os manifestantes cantavam isso. Por que? Porque não trabalhamos a ideia de que, para cumprir a lei, o policial não precisa violar a lei. Para cumprir a constituição, não precisamos torturar as pessoas.
Não podemos aceitar essa lógica norte-americana do Estado de exceção. Ela não é só norte-americana, mas lá é onde cala mais fundo. Também não podemos aceitar algoritmos de extermínio. Eles estão nos drones [nos EUA], mas aqui fazem parte do imaginário de muitas pessoas que assistem esses programas de violência, à tarde, na televisão. As emissoras deveriam ser processadas a cada absurdo que o apresentador e o âncora dizem. Um juiz pode dizer que os direitos fundamentais não são absolutos? Essa é a opinião dele, mas, então, eu também quero dar a minha: direitos fundamentais são absolutos, sim. Nada pode suprimí-los, mas esse juiz diz o contrário. Ele faz o que quer porque tem uma caneta na mão e um tribunal acima dele que está articulando um golpe no Brasil e lhe dá suporte. Eu acho uma aberração o que está acontecendo, e nós vamos ter que mexer em tudo isso. Vamos ter que mexer na situação do negro no Brasil, e na das mulheres. A grande surpresa, a grande novidade no meio dessa tragédia toda, é que os três grandes focos de resistência que temos visto nas ruas são os movimentos feministas, os movimentos anti-racistas e os movimentos dos jovens que ocuparam escolas em defesa da Educação. Dentre esses três movimentos, quem primeiro se levantou contra a direita tacanha, em São Paulo, foram as feministas. Essa é uma outra lógica, que vai mudar profundamente os valores da nossa sociedade. Essa é uma boa notícia!
Marcelo Tramontano: A criminalização do debate significa, em última instância, criminalizar a produção de conhecimento e o exercício do pensamento livre. Diversos espaços propiciados pela Internet - entre eles as redes sociais, mas não apenas - têm constituído um ágora onde esse exercício ocorre, ainda que, muitas vezes, pautado pela imprensa corporativa e por agentes do Estado, mas também por grupos e indivíduos com vivências e opiniões absolutamente variadas. De que maneira a criminalização do debate nesse ágora tem se servido de estratégias militarizantes?
Sérgio Amadeu da Silveira: Estamos vivendo hoje um processo de militarização geral da Internet. A Internet é vigiada o tempo todo a partir do grande poder computacional de algumas agências, como a NSA [National Security Agency, dos EUA]. Ela nos considera a todos como suspeitos, como simpatizantes dos inimigos da expansão de poder norte-americana. Vários teóricos liberais, como Joseph Nye Jr., e até mesmo teóricos do Departamento de Estado norte-americano, como [John] Arquilla e [David] Ronfeldlt dizem que, principalmente depois do 11 de setembro, é necessário mudar a estratégia de ação dos EUA. E eles mudaram: a CIA perdeu força, a NSA ganhou força, ganhou mais recursos, e a espionagem, que antes era focada em alguns indivíduos, em alguns grupos, é agora massiva na rede. Ela é feita, por exemplo, através do uso do data mining, como [Edward] Snowden nos mostrou em junho de 2013. Ou seja, essa militarização visa manter um esquema de poder global, essa é a questão. Para a manutenção desse esquema, é fundamental que exista um inimigo, isso que tem que ficar claro. As verbas de segurança dos EUA equivalem a um PIB brasileiro. Para que tudo isso? Porque, supostamente, há um inimigo, uma besta, um cão mundial, um inimigo brutal que precisa ser enfrentado e que está em todos os lugares, sobretudo agora com essa rede distribuída.
Joseph Nye Jr. diz que o poder de vigiar a Internet que os Estados nacionais têm é bem menor do que o poder que eles têm para vigiar os mares, os ares e a terra. Ele diz que [no mundo físico] eles têm esse poder, mas, na Internet, não têm. Então, vem um grupo como o Wikileaks e coloca em crise esse poder. Olha que situação! Essas agências de segurança trabalham com a farsa. Julien Assange está impedido de sair da Embaixada do Equador, em Londres, porque é acusado de um crime sexual na Suécia. Se ele pisar em um aeroporto da Suécia, acordos de extradição [entre Suécia e EUA] o levam para os EUA. O tempo todo vemos um jogo cínico, o mesmo cinismo que se vê no Brasil, do golpe. A imprensa internacional tem dito que, no Brasil, políticos chafurdados na lama da corrupção afirmam que estão passando o país a limpo. Isso é um absurdo!
O cinismo é parte da política que nós estamos vivenciando hoje, no Brasil, apesar de essa política do cinismo não ser apenas brasileira. Vários dos seus componentes são encontrados aqui, como a espetacularização, o mercado totalizante e a militarização. Durante todo o governo [do ex-presidente] Lula, as polícias militares navegaram sem nenhuma restrição porque infelizmente não era importante para o PT mexer profundamente na máquina da repressão, que vem desde a ditadura militar. Não era tão importante trabalhar os direitos humanos, cujos valores deveriam ter sido trabalhados. Quem lidava com valores era considerado bobo, era considerado uma figura menor, um ingênuo. Agora vemos o resultado dessas políticas. A lei do crime organizado e a lei anti-terrorismo, descabidas e exageradas, foram projetos do PT, no governo da [presidenta] Dilma. O golpe que está em curso não rompe uma estrutura constitucional e cria atos institucionais porque ele não precisa. Basta o Supremo Tribunal Federal, ao arrepio da nossa Constituição, dizer que considera um caso transitado e julgado após a segunda sentença. Pronto. Eles nem ficam vermelhos ao fazer isso!
Marcelo Tramontano: Fazendo, agora, um balanço de todas as questões que você apontou, das conquistas do Brasil até antes do golpe, e, ainda, de espaços de resistência que devem ser preservados, pelos quais é preciso lutar: quais dessas questões, conquistas e espaços de resistência poderíamos considerar boas notícias para esses tempos difíceis?
Sérgio Amadeu da Silveira: Eu penso que, do ponto de vista da mobilização da sociedade, temos um avanço muito grande. Nos movimentos que defendem a sua orientação sexual, nos movimentos anti-racistas, nos vários movimentos feministas. Temos também um novo movimento de juventude. E temos uma profusão de mobilizações de coletivos que utilizam tecnologias digitais, que poderíamos designar como hackers, makers, e que tendem a se expandir nos próximos períodos. Quanto mais corpulento for o Estado, quanto mais ele fizer o mercado invadir a privacidade, mais resistência haverá. Eu acredito muito nas mobilizações que estão acontecendo em todos os cantos do Brasil. Há um movimento novo na esquerda, surgindo também nas comunicações. Os jornalistas livres, o Mídia Ninja, coletivos como A Ponte e outros, começam a disputar narrativas na sociedade. Estou falando de vários movimentos que representam um arejamento. Vejo a possibilidade de ocorrer uma ampla mobilização em defesa da liberdade de comunicação, do direito a se comunicar, que nunca conseguimos fazer antes.
Penso também que vai ocorrer uma série de remixagens e fusões do pensamento crítico, o qual terá que se alterar diante dessa nova situação. Vamos descobrir novas possibilidades, novas lógicas, porque os próprios conceitos com que trabalhamos precisam ser atualizados diante desse mundo no qual estamos vivendo. Face a projetos de cidades inteligentes, nós precisamos de projetos de cidades que respeitem os direitos das pessoas. Ainda não temos a qualificação desses nomes, não temos novos conceitos. Mas acredito que eles precisam ser construídos. Há uma evolução em curso em vários lugares que, de certa maneira, vai se concluir. A resistência vai aumentar. O pensamento crítico vai se revigorar. E, por outro lado, algumas coisas que já nos pareciam velhas, não são velhas de jeito nenhum. A concentração de renda no mundo nunca foi tão grande. Isso coloca a questão do pensamento pela equidade, a justiça pela equidade, como um elemento crucial juntamente com a liberdade. A liberdade próxima da equidade é a grande novidade que nós vamos ter que realizar nos próximos tempos. Temos que pensar muito e agir muito.
Marcelo Tramontano: Para terminar, uma pergunta sobre esses próximos tempos: o futuro lhe parece promissor?
Sérgio Amadeu da Silveira: O futuro me parece promissor, mas é um futuro de muitas batalhas, de muitas derrotas e de muitas tristezas. No entanto, estamos construindo algumas fortalezas do pensamento que, por serem virtuais, não podem ser destruídas por bombas. Eu acho que essa é uma vitória muito grande dessas mobilizações críticas, de um pensamento efetivamente avançado. Entre o liberalismo e as perspectivas totalitárias, nós vamos encontrar formas que sejam atrativas para aqueles que, de fato, não conseguem mais conviver com um mundo tão desigual e sem liberdade.
Então eu acredito que o futuro será feito de grandes vitórias, apesar das derrotas que estamos sofrendo agora. Muitos de nós já descobriram que, daqui em diante, vamos trabalhar fortemente com valores. Isso não se faz só com discurso político, mas com demonstração, com ação, com hipertrofia de canais que os poderosos acham que funcionam muito bem. É nesse sentido que eu penso que haverá um mix do hacking com o saber das comunidades tradicionais, da experiência dos coletivos de periferia com as universidades. Nós vamos ter que experimentar essas mixagens, essas práticas recombinantes e, assim, teremos um outro tipo de futuro.
Não dá mais para ficar parados. Não dá mais para simplesmente se queixar de que "os poderosos têm muita força”. A gente sempre soube disso. Nós nos iludimos achando que isso poderia não ser verdade. Mas é. Então, só nos resta construir uma outra perspectiva, uma outra tecnologia, um outro projeto. E então, quando tivermos um enfrentamento desse porte, alcançaremos algo melhor do que temos hoje. Muito melhor.
Sérgio Amadeu da Silveira is Doctor in Political Sciences and Professor Doctor at the Federal University of ABC, Sao Paulo, where he coordinates the research group Digital culture and Sharing networks. He has been president of the National Institute of Information Technology and a member of the Brazilian Internet Manager Committee. He studies relations between communication and technology, societies of control and privacy, collaborative practices on Internet, and the Theory of Intangible Assets Property.
Marcelo Tramontano is Doctor and Livre-Docente in Architecture and Urbanism, with a Post-Doctor degree in Architecture and Digital Media. He is Associate Professor and researcher at the Institute of Architecture and Urbanism of the University of Sao Paulo (IAU-USP), where he coordinates the Center for Interactive Living Studies, Nomads.usp. He is the Editor-in-chief of V!RUS journal.
How to quote this text: Silveira, S. A.; Tramontano, M., 2016. Fortresses of thought cannot be destroyed by bombs. V!RUS, [e-journal] 13. [online] Available at: <http://143.107.236.240/virus/virus13/?sec=2&item=1&lang=en>. [Accessed: 22 December 2024].
Marcelo Tramontano: Sérgio, what is news?
Sergio Amadeu da Silveira: The news idea is born closely linked to the idea of press, simultaneously to the emergence of press in modern times. Press, for its part, is fundamental to mass society and to the emergence of national states. The news is thus the production of information held by someone. In general, in mass-media-dominated societies, news was produced by corporations that tried to prioritize some information rather than others. They decided what society should know and discuss. This is news.
The idea of news has being changed along with the development of online social networks. Indeed, even before that, when the Internet emerges, there was a reversal of the information flow. Those who once could have channels to speak broadly, such as radio, television, printed newspapers, go to compete with the Internet as a distributed network, that allows people also to create their own news. The most difficult thing, on the Internet, is not to turn a fact into news. The hard part is not to talk, not posting a video, is not to argue. The most difficult thing is to be heard, to be seen. We move then from an economy of dissemination and diffusion to an economy of attention. The Internet reverses the game. Many begin to dispute the possibility of creating news. Of course we are not naive to think that big corporations which already existed in the industrial world did not reposition themselves, penetrating the networks and also managing to guide them more than a common citizen can do. There is a very large asymmetry in the distribution of information, although there has been a reversal of the informational ecosystem with the emergence of the Internet.
On the other hand, the mainstream media, ie. the great power groups, are no longer as easy to stifle and control information as they were in the industrial world, a world controlled by mass media. They now have to face a multitude of collectives, messages, and at any time an ordinary person or a small group can bring information that becomes news and ends up gaining huge impact on digital networks. Not even the mighty North-american State managed to prevent a small group of hackers, journalists and activists gathered around Wikileaks from releasing important documents that unmasked the official speech of the world's most powerful State. We thus have a news production game today on the Internet, much more rich and diverse than before, but that did not destroy power asymmetries.
In the universe of blogs, for example, before the emergence of some social networks, and particularly Facebook, the game was more democratizing and less controlled than the news production within these networks. Why? Because Facebook effectively controls information display. To reach the broader audience they want to reach, people have to rely on the benevolence of Facebook algorithms or have to pay for its service. Thus, within the Internet, which is a distributed network, this social network verticalizes again information flows. It returns to Capital the great power this latter had in the mass media world, in which large corporations with a huge amount of financial resources could make advertisements, placements, and buy newspaper editions.
In the case of Facebook, it is clear that large economic groups, big corporations, politicians with a lot of money, now pay for more information views. In this new terrain of social networks where news is produced, released, disseminated and shared, Facebook is guided by completely obscure criteria, by algorithms settings that we do not control, run by a private group that controls the platform where debates widely occur and information is disseminated. Today, news is disputed on the Internet, so the game has become more complex. As several groups dispute their truths in the network, including what to report and from what angle to report, we may have the feeling there are very intense clashes that did not exist before.
In a world dominated by mass communication, such sharp confrontations were actually not visible, as few people had the power of speech as they do today. We can not be romantic and find, as some want, that before the Internet there was a Habermasian debate, aimed at understanding, and that such debate has ceased to exist. In the mass media world there was no debate, or there was only consented debate. Now there are confrontations, or little debate and a lot of confrontation. But we must not therefore think that only hatred prevails in this present reality. We realize, yes, that we are living in a period in which values that many believed to be consolidated in society, in fact are not. And it is good to make that clear. I think it is extremely positive to realize that we still have much to advance in the so-called defense of diversity, tolerance, and respect for the other. Tolerance and respect for other's opinion are key to establishing a democratic society, focused on diversity and not in a single way of thinking.
On the other hand, we are living in parallel the worship of the so-called single thought (pensée unique) and exceptional forms of power. Long ago, Italian theorist and philosopher Giorgio Agamben said we were living a new paradigm of government based on the exception. In his book "State of Exception," he begins by discussing September 11, and then comes to the homo sacer, a strange figure existing in Ancient Rome. He sees this figure arise all the time in our current daily life in various regions of the world. Agamben believes such figure is the exception and that, to defend the law, one must always violate it. To defend the constitution, to defend the good, the righteous, some believe that the government has to act exceptionally. This logic becomes a widely supported paradigm of government. We find that this State of exception logic gains strength in a particular thought that we currently have in Brazil - a kind of neo-fascism - and we realize that we never looked with due attention to a certain entertainment speech based on the crime spectacularization. Such discourse exaggerates the conflicts that occur in our society, supported by the understanding that a conflict is absurd and, therefore, if there is conflict, there is crime. We have to stop it.
There is a profusion of television shows on police violence that worship the logic of exception. "The law aims to defend bandits." This thought is being built since long time. Its aesthetic is of violence, of a police State, and every aesthetic carries values and brings ethics. Ethics such shows worship is completely totalitarian. It ignores conflicts, social confrontations, and is unaware of the matrices leading to clashes. It simplifies solutions, as if the cause of the existence of criminals was the fact that the police does not act with due rigor. That would mean that if we act with due rigor, there will be no more crime. Such simplistic logics proliferate along with societal values we also failed to consider in our reflections. Several scholars even considered them, but they stayed on the sidelines of the great social sciences philosophical debate, on the issue of our country having lived 400 years of slavery during its little more than 500 years. This issue left deep marks on our society, which we did not tackle.
During most of the twentieth century, we lived in our country with authoritarian regimes, coups and dictatorships, and now, in the 21st century, we have to face a new coup. Some say that what we are living is not a coup, because there is no military participation. Military for what? Military do not have to put tanks on the streets: police are already military. We have never faced the militarization that came from the military dictatorship, which remained in the streets dealing with peripheral areas as occupation areas, as if no population lived there but criminals covered in the slums, houses and tenements. This is how those policemen reason. No wonder they call their vehicles with four heavily armed men "tactical unit", ROTA, or something like that. They act as occupying forces in the peripheral areas. At no time this is police. Police is a civil activity, a defense activity of society, it is an activity that even faced controversy to settle in London, for example. There is, in short, a whole debate about what a police is. But in Brazil such debate does not exist. Police here is indeed an occupation troop. If it has been necessary to put tanks on the streets in 1964, to spread the strength of militarism, it is enough today to put ROTA on the streets.
The governor of Sao Paulo sends the police on the streets to attack young students, and this creates a very interesting situation. Some judges did not allow the police to expel adolescents under the age of 18 from [public primary and secondary] occupied schools. In order to prevent such judicial orders from being issued, which would disrupt the government plans to close schools, the governor named a judge his Secretary of Education, a former judge of the Sao Paulo Superior Court. Why did he do it? Precisely because his political party, which organizes the main action of total market supremacy, of mercantilist totalitarianism today in Brazil, brings a new face of the old authoritarianism. They consider social issues as a case of police. All of this is rooted in societal values that we have not reviewed.
Of course we are living a conservative wave all over the world. US alternatives were not good: either Donald Trump or Hillary Clinton. The good, democratic alternative they had, to the left, failed to win the primaries. In Spain, we had a very great hope in the Podemos party but actually they have not been able to move forward as we believed they would. Right wing itself is being reorganized granting Ciudadanos and other groups a new face that also contend a new discourse. But we know that this new discourse is actually the old totalizing message. Worldwide, there has been a resurgence of anti-democratic values, let's say it this way. Therefore, there is no great surprise in the assertion that what we are experiencing in Brazil is the rebirth of discourses that may not even need to be reborn, since they were all the time with us. Our economically dominant classes - the middle and upper-middle classes - can not cope with diversity for a long time. They do not want rights, but privileges.
Marcelo Tramontano: There is, however, a certain surprise in the process you describe which resulted in a coup d'état this year in Brazil. I mean the support this coup received from historically oppressed social groups, including many residents of poor neighborhoods. On the other hand, there was - and there is - manipulation in the news construction and information dissemination by large communications companies in order to shape opinions, discredit opponents and induce public actions. Do you see a connection between these two facts?
Sérgio Amadeu da Silveira: Most of the population of peripheral areas did not get involved with what we are describing as a coup. What really happened was mostly a manifestation of the middle strata. At least in the places I accompanied it, such as Sao Paulo, Belo Horizonte and Rio de Janeiro, mobilization was fundamentally of the middle and upper middle classes. However, it is equally surprising that middle strata have adhered to this. Among the causes of this adherence, I see the fact that democratic values, coexistence with diversity, acceptance that work is noble and must be respected, even for those who perform manual labor, have not been very well incorporated by these social groups. They defend the idea of the "farmer house against the slave quarters", and that those who work do not deserve respect. The ennobling work discourse is only used in a mythical way. In everyday life, elites and middle classes just do not accept basic workers' rights.
Take the great turnaround in 2012 or 2013, when more concrete rights were granted to domestic workers in Brazil. It was a turning point for the middle class. Many people were outraged as they had that aristocratic understanding: "I belong to a certain social stratum, I pay someone as a servant, so we do not have a full working relationship: she does favors, I do favors." According to this way of thinking, domestic employer sees himself as superior to the maid and considers the fact of "even letting that person sleep in my house" is a concession. These are very strong things. When one start changing a country social structures, those middle classes that have rebelled against the minimum income distribution that took place in the country are affected. A little income distribution in a very short time period.
On the other hand, we saw a very high penetration of the idea, widely held by the Lula government itself, that we must include more segments of the population in consumer practices. In other words, market remained the epicenter of society. Important cultural movements were organized in the peripheries, but in a certain way they go in the same sense of market supremacy. For example, the ostentatious funk movement, which is the cult of money and consumerism. Some researchers see this movement in a positive perspective, periphery also claiming its rights. I tend to think that they do not exactly want rights, but money to consume. And the logic of consumption is not based on rights, but on merchandise, on purchasing power. One might ask: "But is this not the same than the union struggle?" Of course not! In the union struggle we seek reasonable remuneration rights so that all of us in our class can reach decent living standards, better living and working conditions. Ostentatious funk worships exacerbated individualism that believes in total power of money. This logic is not very positive for those who argue that we need to overcome adversity in our country, that we must have solidarity, that the market is not everything, and that not all logic should move to the competition context. Worshipping collaboration and sharing is also necessary.
I think many segments that joined the wave created by the Conservatives and strong media will quickly wear and gradually straying from it, as their living conditions will worsen. But today in the peripheries, organized leftists political work no longer exists. In the case of Sao Paulo, the discipline is imposed by the PCC [First Command of the Capital, criminal organization], which actually does small causes justice in peripherial neighborhoods. There are no more [catholic] basic ecclesial communities, but evangelical churches. These have a political control relationship with their faithful that Catholic Church never had. No confrontation of values there. It exists in the students movement of young people who are occupying schools, the movement for housing, even though they need to move forward harder.
Marcelo Tramontano: Let us dig that a bit deeper. On the one hand, for decades and particularly in Brazil, corporate press - television, printed, radio - has played a very important role in the constitution of the so-called public opinion. Mass communication, a "one-to-many" mode of communication, contrasts with distributed online communication "from many to many", which can be more democratic. However, State and its executive, legislative and judicial spheres agents has also increasingly used online networks seeking to shape public opinion.
Sérgio Amadeu da Silveira: My feeling is that we are experiencing a gathering of those who have the vocation to work for social change. We see, on the one hand, an offensive of the most reactionary sectors that managed to rally the middle class. Such sectors have great strength. They have extensively used techniques of [social online] networks, many advertising resources, and network mobilization languages. This is rather curious because some people had the illusion that digital networks were essentially collaborative, always in the democratic sense. This is not true. Online networks have been flooded by corporations and by single thought. We have no illusions about that: online networks are also a territory of the Capital.
Nevertheless, networks allowed the emergence of several rebel collectives, acting in the exercise of counter-power, confronting the State-established regimes of truth. But this has been done in an ambivalent environment with ambivalent technologies. We have, therefore, a confrontation in which traditional Left members realize only now they must be prepared for a discursive struggle of great intensity. A continuous clash, as it happens in the networks. What consolidates the current coup in Brazil is a merger between the judiciary - which in Brazil has long belonged to the colonels, fazendeiros children, bankers children, i.e. the elite of the elite - with a media operation. Without creating a thesis as of the domain of fact, without making a selection of what to look at and not to look at, without therefore promoting a selective posture, it would not be possible to implement all the operation that mobilized much of the country against an established government. It would not be possible to prevent population from rebelling in the streets, in a massive way, in favor of a government being deposed.
Because, in fact, the mobilizations of the majority of the population were of opinion. There was no massive outrage against the fraudulent mechanism they produced to overthrow the government. There was no indignation that put this attitude into question. A court-media operation was carried out, which included the rigging of the judiciary by the political group that controls the State of São Paulo, the Public Prosecutor's Office and the main positions of the judiciary in Brasilia. It included the [Supreme Court Judge] Gilmar Mendes, who, by mastering that machine, makes politics through the Judiciary. Brazil is one of the few countries in the world where judges are famous as political personalities. This means the bankruptcy of the democratic system. In the Judiciary, the judges must speak through the proceedings and the process. Not here: the prosecutor - who is not part of the Judiciary but plays an essential role in Justice - produces and conveys a motivational slide set [against a political opponent, the former President Lula] that does not contain a single concrete evidence. That prosecutor did not do it focusing on the case, and serious lawyers say it was a provocation. The slides set presented by [prosecutor] Dallagnol in Curitiba to demonstrate that the former president Lula was head of a gang immediately became a meme and even stimulated the emergence of similar ironic slides sets on social networks. Indeed, it was amazing to see, once again, humor being used as a political weapon in social networks. The prosecutor did not present any evidence because he did not want to speak to the process: he wanted to talk to the Globo television network. This is so true that Globo network interrupted its normal shows schedule to give voice to the promoter in his theatrical act.
What has been proven against the alleged "chief of the gang" [former president Lula]? He had his fiscal secrecy broken, his privacy was invaded and, as we have seen, only were found a countryhouse that is not his, an apartment that he was going to buy - but eventually he didn't - and a cheap metal boat. This articulation is typical of the dominant Brazilian strata. They have already done so in the coup of the Estado Novo, when Getúlio Vargas imposed a dictatorship and almost decided to support the Axis and the Nazism [in World War II]. We have a bad history with these elites. There they are today, in this perfumed boutique fascism, in which intellectuals such as [former president] Fernando Henrique Cardoso intend to produce a coup within the coup. Part of this coup perpetrators seem to will to bring Fernando Henrique Cardoso back to the presidency, now indirectly elected by the National Congress, to accomplish what is really their project: to be the vanguard of market totalitarianism.
I will better explain this expression. In the 1980s and 1990s, the world in general and Brazil in particular had highly profitable economic sectors, formed and maintained by the State: the telecommunications, energy, and transportation sectors. These three sectors are highly profitable to this day, and have been withdrawn from the State. The neoliberal argument was: "we have to get these sectors out of the state, because the state must be minimal and should not face financial loss". But these sectors were removed from the State's control and it did not downsized. Their percentages in relation to GDP remained roughly the same. What happened? Why was privatization necessary? Because Capital has an expansive tendency, it needs to reproduce more and more strongly, and the financial sectors have bet heavily on energy and telecommunications. Which frontier of privatization can now be highly profitable? The health and welfare sectors and also education, if the public education sector is dismantled. Their reasoning is: "After all, why keep funding federal universities if we can buy places in private structures of Kroton [educational] systems, as desires Mr. [Jorge Paulo] Lemann?". Neoliberals effectively target these sectors, no need to mention Social Security. By blasting off welfare system, they get a sector where they can profit enormously. And the State stands behind them, as it does anywhere in the world: when such companies break down, State comes to the rescue. Indeed, as several researchers say, the minimum state is the state of maximum support for capital.
This policy is implemented against those who want to distribute income. Someone living in a small town in the interior of Sao Paulo state, which is a well-developed state, whose father earns, let' say, a minimum wage or is a tiller. This person studies in a public rural school and has little prospect of social mobility. The school is underqualified, teachers' wages are low, and still the governor wants to close schools. The neoliberal Sao Paulo State's Governor does not pay decent wages to elementary school teachers and says that salary is not important - salary is only important for him, his family, for judges and capitalists, but for teachers, salary is not important. See the irony. This boy, this girl, who lives in the richest state in Brazil, has a little auspicious future because he or she will have no chance. Even if they do, the opportunities are not equal for everyone because there is a violent funnel. It happens that distributive policies, which also aim to give new subjective possibilities to young people, need to be built with the State too. The minimal state supporting the maximum market is against this. Therefore, it needs boutique fascists who are operating this action against the creative awakening of our population. They act against collaborative practices that can build another kind of future, and against the search for new forms of coexistence. There they are, with this true noopolitics, in the words of Maurizio Lazzarato.
They no longer want to just control the body. They have not only a biopolitics that states have been doing since the nineteenth century. Now they have a policy for thought. And, according to this policy for thought, dissense and debate against it should be criminalized. No wonder that right-wing deputies support the project known as "School with no party," because they believe the debate must be demonized. Diversity is not good for the total market. The total market, in the words of Gilles Deleuze, is a matrix of thought, an axiomatics of Capital and we are living it. We have been experiencing this axiomatics since long time, but now we see its expansion. And it is very interesting to realize that it takes place on the social networking platform as well.
Authors like Guy Débord must be updated, as he dealt with the society of the spectacle, a visual society. What, in the end, was the master cog of spectacularization? In my view, it was the exaggerated mercantilization that Débord already perceived in the 1960s, imagine now! The Internet did not reduce the society of the spectacle: it expanded spectacularization. It strikes at subjectivities in a brutal way. As soon as we meet someone today, let's go to Facebook to see that person's profile. If she has no Facebook profile, neither Instagram nor Twitter, we already think she's a CIA agent, because she does not exist, she's a robot! This situation represents a pressure which is different from the Big Brother totalitarianism, because here it is a distributed totalitarianism. This is the question we are facing today and we need to confront.
On the other hand, a great wave of new perceptions has moved us. This is really good. Of course, we will suffer a lot, and the populations at risk, more impoverished, will also suffer greatly. But I think we will have to make profound changes in our country. We can no longer ignore changes in values, as we ignored changes in the ideas of rights, of respect. Nor have we eliminated the military police. I was in a demonstration recently where people were shouting, "It's not over / It's going to end / I want the end of the Military Police." Those parts of the population that do not have an approach to this logic may find that those demonstrators are against the police, since the police, for them, are the Military Police. They are actually saying that they are against the militarization of the police, not against the police. But this idea is not popular, people seemed uncomfortable when the protesters sang it. Why? Because we did not cultivate the idea that, in order to comply with the law, the police officer does not have to break the law. To fulfill the constitution, we do not have to torture people.
We can not accept this American logic of the state of exception. It is not only American, but that's where it is most intense. Nor can we accept extermination algorithms. They are in the drones [in USA], but here they are part of the imagery of many of the people who watch violence shows in the afternoon on television. Broadcasters should be sued for every absurdity the presenter and the anchor say. May a judge say that fundamental rights are not absolute? This is his opinion, but then I also want to give my own: fundamental rights are absolute, for sure. Nothing can suppress them, but this judge says otherwise. He does what he wants because he has a pen in hand and a court above him that is articulating a coup in Brazil and gives him support. What is happening is an freak, and we will have to deal with it all. We will have to deal with the situation of black people in Brazil, and the situation of women. The great surprise, the great novelty in the midst of this whole tragedy, is that the three main centers of resistance we have seen on the streets are the feminist movements, the anti-racist movements and the youth movements that occupied schools in defense of Education. Among those three movements, those who first rose up against the narrow-minded right-wing in Sao Paulo were feminists. This is another logic that will profoundly change the values of our society. This is good news!
Marcelo Tramontano: Debate criminalization means, ultimately, criminalizing the production of knowledge and the exercise of free thought. Various spaces provided by the Internet - among them social networks, but not only - have constituted an agora where this exercise occurs, albeit often guided by the corporate press and agents of the State, and by groups and individuals with experiences and opinions absolutely varied. How the criminalization of the debate in this agora has been using militarizing strategies?
Sérgio Amadeu da Silveira: We are experiencing today a process of general militarization of the Internet. The Internet is monitored all the time through the great computing power of some agencies, such as the NSA [National Security Agency, of USA]. This agency considers us all as suspected of sympathizing with the enemies of American power expansion. Several liberal theorists, such as Joseph Nye Jr., and even US State Department theorists such as [John] Arquilla and [David] Ronfeldlt say that, especially after 9/11, it is necessary to change the USA strategy of action. And they have changed it: the CIA has lost strength, the NSA has gained strength, it received more resources, and espionage, which was once focused on some individuals in some groups, is now massive on the network. It is done, for example, through the use of data mining, as [Edward] Snowden showed us in June 2013. In other words, this militarization aims at maintaining a global power scheme, that is the question. It must be made clear that, in order to maintain this scheme, the existence of an enemy is fundamental. The US security funds are equivalent to the Brazilian GDP. What's all this for? Because, supposedly, there is an enemy, a beast, a world canis, a brutal enemy that needs to be faced and which is everywhere, especially now with this distributed network.
Joseph Nye Jr. says that the power of monitoring the Internet owned by nation states is far less than the power they have to watch over the seas, airs and land. He says that [in the physical world] they have such power, but, on the Internet, they do not. Then comes a group like Wikileaks and puts that power in crisis. Security agencies operate through farces. Julien Assange is barred from leaving the Embassy of Ecuador in London because he is accused of a sex crime in Sweden. If he steps in a Swedish airport, extradition agreements [between Sweden and the US] take him to the US. The whole time we are watching a cynical game, the same cynicism that can be seen in Brazil of the coup. The international press has said that in Brazil, politicians wallowing in the mud of corruption say they are cleaning the country. This is absurd!
Cynicism is part of the politics we are experiencing today in Brazil, even though this politics of cynicism is not only Brazilian. Several of its components are found here, such as spectacularization, the totalizing market and militarization. Throughout the administration [of the former president] Lula, the military police sailed without any restriction because unfortunately it was not important for the Workers' Party to stir deeply in the machine of the repression, which comes from the military dictatorship. It was not that important to work on human rights, whose values should have been worked out. Those who dealt with values were considered silly, a minor figure, a naive. Now we can see the result of these policies. The so-called organized crime law and anti-terrorism law, misplaced and exaggerated, were projects of the Workers' Party under [President] Dilma's government. The ongoing coup does not break a constitutional structure and creates institutional acts because it does not have to do that. It is enough that the Federal Supreme Court, in breach of our Constitution, says that it considers a case passed and tried after the second sentence. Ready. They do not even turn red when they do that!
Marcelo Tramontano: Taking stock of all the issues you have pointed out, the achievements of Brazil before the coup, and also spaces of resistance that must be preserved, which must be fought: which of these issues, achievements and spaces of resistance could we consider good news for these hard times?
Sérgio Amadeu da Silveira: From the point of view of the mobilization of society, I think we have a very great advance. In movements that defend their sexual orientation, in anti-racist movements, in the various feminist movements. We also have a new youth movement. And we have a profusion of collective mobilizations that use digital technologies, which we could designate as hackers, makers, and that tend to expand in the coming periods. The more burly the state, the more it makes the market invade privacy, the more resistance there will be. I believe very much in the mobilizations that are happening in every corner of Brazil. There is a new movement on the left, also appearing in communications. Free journalists, Midia Ninja, many collectives as A Ponte among others begin to dispute narratives within the society. I am talking about several movements that represent a refreshing aeration. I see the possibility of a wide mobilization we have never been able to do before, in defense of the freedom of communication and the right to communicate.
I also think that there will be a series of remixing and mergers of critical thinking, which will have to change due to this new situation. We will discover new possibilities, new logics, because the very concepts we work with need to be updated in the world we are living in. To face smart city projects, we need city projects that respect people's rights. We do not yet have the qualification of these names, nor we have new concepts. But I believe they must be built. An evolution is underway in several places which will be concluded somehow. Resistance will increase. Critical thinking will invigorate. On the other hand, certain things that seemed old to us are not old at all. The concentration of income in the world has never been so great. This brings us to the question of equity thinking, justice for equity, as a crucial element along with freedom. Freedom, close to equity, is the great novelty that we are going to have to accomplish in the near future. We have to think hard and act a lot.
Marcelo Tramontano: Finally, a question about these coming times: does the future look promising to you?
Sérgio Amadeu da Silveira: The future seems promising to me, but it is a future of many battles, many defeats and many sorrows. However, we are building some fortresses of thought that, being virtual, can not be destroyed by bombs. I think this is a very big victory of those critical mobilizations, of an effectively advanced thinking. Between liberalism and totalitarian perspectives, we will find forms that are attractive to those who, in fact, can no longer live with such a unequal world and without freedom.
So I believe the future will be made of great victories, despite the defeats we are suffering now. Many of us have already discovered that from now on we are going to work strongly on values. This can not be done only with political speech, but with demonstration, with action, with hypertrophy of channels that the powerful believe to work very well. In this sense I think there will be a mix of hacking with the knowledge of traditional communities, the experience of the peripheral collectives with the universities. We'll have to try these mixes, these recombinant practices and thus have a different kind of future.
We can not stand still. We can no longer simply complain that "mighty dominant people have much strength." We always knew that. We deluded ourselves that this would not be true. But it is. Therefore we have to build another perspective, another technology, another project. And then, when we will have a confrontation of this size, we will achieve something better than we have today. Much better.